NICOLA, José de; NICOLA, Lucas de; Semana de 22: Antes do Começo, Depois do Fim
Resumo:O Modernismo e a hegemonia cultural paulistaO surgimento da capital econômica do nascente Brasil modernoPlantar cana no nordeste, encontrar ouro nas gerais. Essa parece ser a senda que nos primeiros séculos a colonização do Brasil seguiu, e a razão da localização de suas primeiras capitais.Mas então a escravidão chegou ao fim (nunca em sua totalidade, lamentavelmente), e no final do século XIX o café criou uma nova capital.Do alto de uma serra íngreme, colada ao litoral, nasce um rio que, ao invés do mar, corre para o centro do continente. Uma via privilegiada que os povos originários já conheciam há muito tempo.São Paulo nasce numa colina entre dois dos afluentes dessa grande hidrovia chamada Rio Tietê, que corta um imenso planalto de terras férteis, perfeitas para o cultivo do café."São Paulo se localiza no ponto de mais fácil acesso entre o litoral e o Planalto de Piratininga, constituindo-se em uma porta de entrada para o interior [...], tornando a cidade um centro de inversões do capital cafeeiro". Ponto de convergência de várias estradas de ferro, que traziam o café do interior rumo ao porto de Santos, "todos os caminhos levavam a São Paulo, tornando-a um incontornável polo econômico." (p.25).No sentido oposto, a mão de obra trazida da Europa e do Japão passava por São Paulo vinda de Santos e seguia pelas mesmas ferrovias rumo às fazendas de café. "Boa parte dos estrangeiros – italianos, espanhóis, portugueses, eslavos, alemães e japoneses – que passaram a compor a população da cidade de São Paulo, rumaram primeiro para o interior e, depois, escapando das péssimas condições de trabalho nas fazendas, voltaram para a capital, sendo empregados na crescente produção industrial." (p.28).Já os fazendeiros, pela proximidade com as instituições financeiras e serviços, erigiam seus palacetes nos bairros mais nobres e passavam a usufruir dos benefícios da urbanidade.De pouco mais de vinte mil habitantes em 1872, no "alvorecer da década de 1920, a população da cidade atingiria a marca de espantosos 600 mil habitantes." (p.27). "Em 1901, 90% dos operários da cidade eram europeus, em sua grande maioria italianos. Em 1905, metade da população era formada por italianos, um índice que, dez anos depois, estaria entre 35 e 40%. A partir desses dados, é possível imaginar um espaço urbano onde havia uma intensa experiência de diversidade e cosmopolitismo, um lugar no qual diferentes línguas, trajetórias e culturas passavam a ser postas lado a lado, apesar das grandes desigualdades e dos conflitos que pudessem surgir." (p.29).Da pequena província que logo se tornaria a capital econômica, surgia um sonho de nação, sempre com a Europa como referência. Mas, pela primeira vez, o desejo de criar uma identidade cultural própria contava com os elementos necessários para se concretizar. Uma nascente burguesia industrial, operários e estudantes estavam prontos para colocar o país na rota da modernidade. A arte, como representação desse momento, necessitava de uma nova estrutura. E a Semana de Arte Moderna de 22 foi o marco desse movimento.Realizada no Teatro Municipal de São Paulo, onde um grupo de intelectuais e artistas declararia o rompimento com o conservadorismo artístico tradicional, como o simbolismo e o parnasianismo, a Semana de Arte Moderna propunha a renovação da expressão artística brasileira."Como afirmaria Oswald de Andrade, em Um homem sem profissão, livro de memórias publicado alguns meses antes de sua morte, em 1954: “Nossos pais vinham do patriarcado rural, nós inaugurávamos a era da indústria.” (p.18).Eram, portanto os filhos dessa burguesia enriquecida pelo café que agora reivindicavam a direção da identidade cultural de um país que almejava se industrializar e, assim, se tornar urbano e moderno. Arquivo
Peter D. Thomas - The Gramscian Moment
Sobre Peter D. Thomas e o marxismo de GramsciTradução Matheus CorreiaO livro de Peter D. Thomas, The Gramscian Moment: Philosophy, Hegemony and Marxism1, tem gerado um novo interesse pelo pensamento de Gramsci nos âmbitos da esquerda acadêmica e política na Inglaterra e França, e se converteu em certa medida em um acontecimento intelectual internacional.Os motivos para este sucesso são vários. Em primeiro lugar, um certo “vácuo” teórico concernente às estratégias da esquerda, entendida esta em sentido amplo. Em uma situação de relativa ascensão das coligações da esquerda reformista, passado o momento das “ilusões sociais” que expressou a moda autonomista, as elaborações de Thomas oferecem hipóteses de reconstrução do marxismo pela via de um resgate do pensamento de Gramcsi, com afinidades em direção aos novos movimentos surgidos nos último anos: Ocuppy Wall Street, a Primavera Árabe e movimentos anticapitalistas em geral, e ao tentar retomar a questão “político-estratégica”.Através de sua leitura de Gramcsi, Thomas postula um pensamento alternativo ao “pós-marxismo” que terminou transformado em uma base ideológica de distintas variantes de projetos “populistas” - sobretudo nos governos que na América Latina conhecidos como “pós-neoliberais” - e também em uma situação de decadência, postulando a seu modo também a questão da centralidade operária, sem cair no “obrerismo” temido ao máximo pela esquerda britânica e francesa.Desde o ponto de vista teórico, Thomas tem o mérito de fazer acessível ao leitor de língua inglesa certas conclusões dos estudos gramscianos mais recentes, em uma “cultura marxista” onde a principal recepção a Gramsci se faz através do prisma althusseriano; distintos nesse sentido são os casos por exemplo da Argentina ou em parte da América Latina, onde essa contaminação existiu, mas não impediu o desenvolvimento de uma tradição propriamente gramsciana independente ou não necessariamente marcada pelo enfrentamento com Althusser.Nas pegadas do Estado IntegralA revalorização de Thomas do pensamento de Antonio Gramsci se constrói a partir de polêmicas contra as interpretações do pensamento do comunista italiano praticadas em As Antinomias de Antonio Gramsci de Perry Anderson e Para Ler o Capital de Louis Althusser. Thomas apresenta ambas críticas ao pensamento de Gramsci como complementares e coincidentes com diversos ângulos.Entretanto, os pontos de vista de Althusser e Anderson são essencialmente divergentes em uma questão fundamental: enquanto para Althusser o central passava por uma crítica “teórica” sobre as relações entre marxismo, ciência e filosofia, sem uma dimensão estratégica clara, o eixo selecionado por Anderson passa pela questão estratégica, e nesse contexto se localizam as críticas teóricas. Nesse sentido, a equiparação de Anderson e Althusser que realiza Thomas se torna discutível, ainda que o debate com Anderson sobre a questão do Estado é produtivo para refletir sobre o tema desde o marxismo.Thomas resgata a categoria de “Estado Integral” presente nos textos gramscianos, ainda que sem o nível de sistematização proposto por Thomas, que pode sintetizar a seguinte definição de Gramsci: “O Estado (em seu significado integral: ditadura + hegemonia) (C6 §155)2 e tem uma primeira aparição em C6 § 10 a propósito da história dos intelectuais e suas relações com o surgimento e crise do Estado moderno, contexto em que Gramsci diz que na Revolução Francesa a burguesia “pode apresentar-se como “Estado” integral, com todas as forças intelectuais e morais necessárias e suficientes para organizar uma sociedade completa e perfeita”3.Coincidindo com a necessidade histórica do Estado moderno (burguês) de ter uma base de massas, a categoria de Estado Integral, tal como entende Thomas, permitiria desenvolver uma leitura mais complexa do Estado no século XX e na atualidade.Neste marco, Thomas se vale do Estado Integral para refutar os três “modelos” das relações (oscilantes e variadas) entre Estado e sociedade civil no Ocidente que Anderson identifica na obra de Gramsci: O Estado em contraposição à sociedade civil O Estado abrange a sociedade civil O Estado é idêntico à sociedade civil 4.Assim, define que, com o conceito de “Estado Integral”, “Gramsci tenta analisar a mútua interpenetração e reforço da “sociedade política” e “sociedade civil” (os quais devem ser distinguidos metodologicamente, não organicamente) no interior de uma unificada (e indivisível) forma-Estado” 5.Contra estes modelos, a proposta de Thomas consiste em tentar superar as possíveis “oscilações” e mutações realizadas por Gramsci na distribuição da coerção e consenso entre Estado e Sociedade civil para sustentar que o Estado Integral representa precisamente uma nova forma de articulação entre sociedade política e sociedade civil, de forma tal que a localização da coerção ou o consenso em um só dos dois polos resulta impossível. Thomas sustenta que a categoria de Estado Integral é mais ajustada ao texto gramsciano que a categoria de “Estado Ampliado”, proposta no clássico livro de Buci-Glucskmann Gramsci e o Estado.No entanto, embora possa ser menos rigorosa filologicamente, a ideia de um "Estado Ampliado” ( que Buci-Glucksmann sintetiza como “uma incorporação da hegemonia e seu aparato ao Estado) 6, ademais de não ser tão diferente em seu conteúdo da proposta de Thomas, pode resultar útil “historicamente”, contanto que ela não caia em uma leitura (interpretação da categoria) de "Estado em disputa" ou "mudar o Estado a partir de dentro, lutando no interior de seus aparatos ideológicos".Ou seja, que aquilo a que Gramsci apontava com a ideia de que o Estado em seu significado integral é ditadura mais hegemonia não responde a uma definição estática mediante a qual os Estados do Ocidente são por si só hegemônicos (desde a Revolução Francesa em diante), mas a um processo mais complexo mediante o qual o Estado busca tornar-se de uma base de massas ao mesmo tempo que aperfeiçoa seu aparato repressivo e estende seu controle sobre as organizações que “não são Estado” em sentido estrito, tendência que está bem presente no século XIX, principalmente com a integração ao regime da socialdemocracia, que ganha um salto na época do imperialismo.Esta categoria de Estado Integral tem ganhado popularidade entre intelectuais e acadêmicos, tanto desde o ponto de vista do estudo do pensamento de Gramsci a partir de um ângulo filológico, como desde análises das trocas nas formas estatais nas últimas décadas, em um espectro muito amplo que vai desde as relações entre estado e sociedade civil sob o neoliberalismo até as experiências dos governos “pós-neoliberais” latino-americanos.Embora seja uma contribuição para a compreensão do conceito de Estado em Gramsci, a utilização desta categoria muitas vezes contém a reprodução de um “sentido comum” que atua como “obstáculo epistemológico”: em muitos casos quando se fala de Estado Integral, ainda que se fala do entrelaçamento entre sociedade civil e sociedade política, se segue supervalorizando o aspecto de consenso, de forma tal que se transforma o Estado Integral em um Estado “consensual”, leitura unilateral que por exemplo, se contradiz com a posição de Gramsci sobre a “ampliação” da polícia. Se se perde de vista o aspecto de “coerção” da dominação estatal, se pode cair em posições pacificistas que transformem a luta política em luta cultural ou eleitoral, mas naturalizando ou escondendo a violência estatal e a necessidade de enfrenta-la. Mas essa violência sempre volta (ou nunca se vai), para recordarmos que a “questão do Estado” é um problema que ultrapassa a teoria.Se é correto o que assinala Peter D. Thomas sobre que o Estado Integral se caracteriza pela “mútua interpenetração e reforço da sociedade política e sociedade civil (os quais devem ser distinguidos metodologicamente, não organicamente) no interior de uma unificada (e indivisível) forma-Estado”, isto significa também que a “estatização da sociedade civil”, não se limita a mecanismos de consenso e cooptação, mas inclui o reforço e a extensão do aparato repressivo, de forma tal que o Estado Integral não se contrapõe, mas que inclui e reforça o Estado-policial.Teoria, nova imanência e política revolucionáriaThomas sintetiza a “filosofia da práxis” com os três conceitos gramscianos de humanismo absoluto, imanência absoluta e historicismo absoluto. Busca estabelecer, a partir desses conceitos, as relações levantadas por Gramsci entre história, filosofia e política. Nesse marco, aborda a questão do “novo conceito de imanência” levantado por Gramsci.Nos Cadernos do Cárcere, a ideia de um “novo conceito de imanência” ou uma nova imanência aparece relacionada com três possíveis linhas de interpretação (todas convergentes). Uma continuidade da filosofia imanentista, depurando a versão especulativa desta que oferece ao hegelianismo (recordemos que Hegel considerava a filosofia de Spinoza como um “momento” de seu sistema. Isso está presente na Fenomenologia do Espírito, mas sobre tudo está explicado acabadamente na Ciência da Lógica), para uma compreensão realista e concreta da história. Uma síntese teórica que une a filosofia alemã, a economia política inglesa e a política revolucionária francesa (as famosas três fontes e três partes integrantes do marxismo), criando uma nova concepção do mundo que em sua vez expressa esta síntese dos três elementos em cada um dos seus segmentos, de forma tal que não há filosofia, política e economia marxista, mas sim uma “filosofia da práxis”, “crítica da economia política” e uma teoria política/estratégica que tem seus fundamentos teóricos nos antecessores e tudo isso é parte de uma “concepção de mundo”. A categoria de “mercado determinado” e “leis tendenciais” que Gramsci associa ao economista David Ricardo e que considera um elemento convergente com a concepção marxista, em tanto contribui a estabelecer, dito com termos não precisamente presentes em Gramsci em explicar “como surge o movimento histórico sobre a base da estrutura” e a questão das relações de forças.Peter D. Thomas, que considerava estes distintos aspectos, tomando, a sua vez, outros estudos gramscianos, intenta fechar o círculo da “nova imanência” com uma definição que é a seguinte: Imanência = Teoria. Creio que se pode ser bem atrativa, não se ajusta ao todo à reflexão gramsciana. Vejamos porquê.Thomas cita uma passajem do Caderno 4, em particular C4 §17, em que Gramsci diz: “a expressão ‘imanência’ em Marx tem um significado preciso e isso é o se deveria definir: na realidade essa definição seria realmente ‘teoria”. Dessa frase, Thomas deriva a definição: Imanência = Teoria.Entretanto, tal derivação está fora de contexto. Dado que Gramsci não está dizendo que a definição de imanência é teoria, mas que o ato de definir o conteúdo preciso da imanência em Marx tinha sido realmente “fazer teoria”. Para afirmar isto nos baseamos por exemplo no Caderno 4 §13, onde Gramsci sustenta a respeito do Ensaio de Bukharin: “A primeira observação a ser feita é que o título não corresponde ao conteúdo do livro. Teoria do materialismo histórico deveria significar ordenação lógica dos conteúdos filosóficos que são conhecidos sob o nome de materialismo histórico. O primeiro capítulo, ou uma introdução geral deveria ter tratado a questão: o que é a filosofia? Uma concepção do mundo é uma filosofia? O materialismo histórico renova esta concepção? Que relações existem entre as ideologias, as concepções de mundo, as filosofias? A resposta a esta série de perguntas constitui a ‘teoria’ do materialismo histórico”. Mais adiante diz que esses são os problemas teóricos e não “os que o autor propõe como tal”.Nesse contexto, ou seja, tendo estabelecido que elaborações ou reflexões têm status “teórico”, Gramsci critica Bukharin por sustentar que a palavra “imanência” tem em Marx um sentido metafórico e por iludir a questão de definir seu significado preciso no pensamento marxiano, o qual seria efetivamente uma definição “teórica”.Contudo, parece um pouco forçado dizer que ali se desprende a fórmula Imanência = Teoria. Enquanto resulta acertado resgatar, como faz Thomas, que na “nova síntese teórica” que por sua vez uma redefinição das relações entre a teoria e a prática, como parte do desenvolvimento da luta por constituir a classe operária como classe hegemônica, unindo filosofia e política, a relação entre história, teoria e política se concebe como “imanente”.Este debate pode ser contextualizado na reflexão gramsciana sobre Maquiavel, sobre qual o lugar da política na filosofia da práxis e a questão da passagem da filosofia à política subvertendo a relação histórica anterior entre teoria e prática, no sentido assinalado por Gramsci no C11 § 49, no âmbito de uma reflexão sobre o "traduzibilidade" das línguas da Revolução Francesa e da filosofia clássica alemã, quando interpreta a Tese 11, assinalando que “a filosofia deve converter-se em política (...) para seguir sendo filosofia”.Se retomamos a questão da “nova imanência” unindo o critério de “traduzibilidade” colocado por Gramcsi entre filosofia e política como chave de interpretação da Tese XI, à luz da pergunta central na reflexão de Gramsci sobre Maquiavel, podemos redefinir o “novo conceito de imanência” como uma nova unidade teoria/prática que é consubstancial para a atividade política revolucionária.Este debate é mais importante não tanto pelo tratamento da questão nos estudos gramscianos, mas sobretudo porque a “imanência” foi durante várias décadas a bandeira, primeiro de um marxismo estruturalista e anti-hegeliano e de um autonomismo inimigo do marxismo clássico, mais tarde pelo pós-estruturalismo em diante.Quando Toni Negri, ressignificando suas próprias elaborações prévias como as presentes em O Trabalho na Constituição e O Poder Constituinte, lançava muito solta de corpo a ideia de que “a multidão chama ao império”, criando uma má infinidade de desafios “por baixo” respondidas por recomposições “por cima”, que por sua vez dava por liquidadas as mediações político-sociais que necessita construir a classe operária junto com os setores oprimidos para melhor lutar (associadas negativamente com a dialética hegeliana) e habilitava a ideia de um “comunismo sem transição”, estava assim utilizando a tradição imanentista para criar uma filosofia política de uma “substância” que não pode “tornar-se sujeito” ou para dizer mais fácil “tomar o mundo sem mudar o poder” ( a inversão do título de Holloway é proposital). De forma tal que o desafio colocado por Pierre Macherey em seu Hegel ou Spinoza de inverter a forma imposta pelo idealista alemão, para ler o materialista judeu-holandês, se transformaria em uma simples degradação do legado de Spinoza à serviço de uma teoria derrotista de luta de classes.Frente a este falso “imanentismo”, o resgate das reflexões gramscianas e sua relação com o “novo materialismo” posto em prática por Marx, permite voltar a pensar nos fundamentos filosóficos do marxismo, não como uma “peça de museu”, mas como uma teoria viva que busca recriar-se contra o pensamento burguês, pseudoautonomista e da esquerda rotineira.Hegemonia, revolução passiva, Príncipe ModernoThomas assinala que em Cadernos do Cárcere a revolução passiva emerge como expressão da “crise orgânica” da sociedade burguesa assim como antítese do fracasso da revolução ativa das classes populares. É precisamente essa figura da “antítese vigorosa”, trazida por Gramsci em C15 §62, onde reside a chave para pensar as relações entre revolução passiva, hegemonia burguesa e proletária e construção de um aparato hegemônico proletário, que no léxico gramsciano, coincide com o Príncipe moderno.Thomas sustenta que a revolução passiva é uma forma de duração (a dizer, continuidade sem progressividade histórica) do sistema capitalista, e que, no entanto, o proletário não constrói sua própria hegemonia sem impor a revolução passiva. Porém, esta ideia da construção de um aparato hegemônico está colocada sem estabelecer uma relação com a experiência da classe operária e suas organizações na luta de classes (o qual, a sua vez incide no tipo de instituição através das quais pensamos que a classe operária pode conquistar sua hegemonia). Desta forma, frente a “duração” da revolução passiva, os tempos da construção da hegemonia podem voltar-se também “vazios”. Isto guarda relação com uma tendência constante na interpretação de Thomas que é a de exacerbar as bordas da “superação do aspecto econômico-corporativo” que contém a teoria da hegemonia, como na interpretação que faz da NEP.Thomas sustenta, neste contexto, que o Príncipe Moderno não seria um mero codinome para o Partido Comunista. Sustenta que pelo contrário, contra o formalismo político próprio da modernidade, no qual as formas políticas subordinam o conteúdo social, o Príncipe Moderno, culmina na constituição de um “partido-laboratório” que é expressão de um conteúdo que constitutivamente o excede. Citamos umas linhas de outro trabalho “Hegemony, passive revolution and the modern Prince”:A consolidação institucional deste processo em um partido de novo tipo, deveria portanto, não ser entendida como a formação de um “sujeito político”, como um centro unificado de propósito e iniciativa, ou um “instrumento” ou “máquina” (...). Pelo contrário, é uma sempre provisória condensação de relações de força que continuamente modifica a composição do Príncipe Moderno como um organismo coletivo, e como um expansivo processo revolucionário em movimento. Sobretudo, o conceito integral do Príncipe Moderno, tanto como uma ampla dinâmica civilizatória como um novo processo institucional de transformação social, representa, em um sentido ativo, um novo tipo de cultura política que deveria ser capaz de valorizar o poder constituinte como a base de uma nova organização social.Se é verdade que Thomas acerta em assinalar que para Gramsci o Príncipe Moderno não é um mero codinome para se referir ao velho PC, sua imagem de um partido de novo tipo aberto ao poder constituinte que vem de baixo parece na realidade destinado a estabelecer um Gramsci que dialogue com o legado do autonomismo e os “partidos amplos anticapitalistas” ou neo-reformistas.Ainda que Gramsci postula um partido que ao desenvolver-se põem em marcha um movimento que subverte toda a estrutura da sociedade, o peso que tem em seu “modelo” a atividade autônoma da classe operária é pequena, e que há diferenças em seu período “conciliar”, nos Cadernos do Cárcere não se fazem referências aos conselhos operários, nem aos comitês de fábrica. A única forma “espontânea” da atividade da classe operária que aparece em suas notas sobre o Príncipe Moderno é o sindicalismo, o qual deve ser superado para estabelecer uma perspectiva realmente hegemônica.Por este motivo, o Príncipe moderno, sempre na visão de Gramsci, contrariamente a qualquer leitura “expressiva” da relação entre conteúdo social e formas políticas, tende a abarcar todo o espectro da atividade da classe operária, e dessa forma subsume e supera politicamente as formas “espontâneas” do movimento social.Do partido-classe (“totalitário” no sentido de que abarca o conjunto da atividade da classe operária e de “massas” no sentido contrário a partido de vanguarda), Thomas realiza uma derivação em direção a um partido-movimento, do qual se mantém seu caráter de movimento histórico e sua forma “ampla”, mas se identifica com experiências que pouco tem a ver com a hegemonia proletária e ao mesmo tempo se investe a relação entre conteúdo social e forma política colocada por Gramsci, deslocando o eixo do político ao social. Aliás, não é a primeira vez que se traz este tipo de interpretação, ampliando a concepção de partido de Gramsci até que abarque diversas experiências de “esquerdas amplas”, populistas ou reformistas.Na tradição de Lenin e Trotsky, este problema da relação entre movimento social e partido se aborda desde outra óptica, na qual o partido (de vanguarda) ganha peso de massas através do desenvolvimento de frações revolucionárias nos sindicatos e organizações de massas, a política de frente única operária, cuja máxima expressão são por sua vez os sovietes e a política hegemônica desde a vanguarda da classe operária até o resto dos setores sociais oprimidos, como os movimentos de mulheres, LGBT’s, estudantes, juventude, ambientalistas, etc.A hipótese do Príncipe moderno, enquanto partido-laboratório, não hierarquiza as tarefas preparatórias que vão desde as lutas teóricas, políticas, até os combates mesmo parciais da luta de classes, que amadurece e se desenvolve um partido revolucionário. E tampouco as diferentes tendências em que se divide o movimento operário (e que são expressão de sua hegemonia social e política), que fazem a existência de umas frações de vanguarda mais avançadas e conscientes que outras.Neste contexto, Thomas considera o plano de desenvolvimento político em termos históricos (a tendência da classe operária a constituir-se em partido), mas fazendo abstração da relação do caráter de classe, as formas organizativas e a estratégia que deve ter esse partido para conseguir o poder operário.Algumas conclusõesO livro The Gramscian Moment tem pontos muito fortes, iniciando pelo trabalho filológico desenvolvido pelo autor, para oferecer uma visão mais completa e precisa do pensamento despregado por Antonio Gramsci em seus Cadernos do Cárcere. Ao longo deste artigo, temos assinalado seus méritos, assim como algumas críticas ao que consideramos pontos débeis da argumentação construída por Thomas. A reflexão mais importante, contudo, ainda precisa ser feita e tem a ver com o quão longe pode propor-se uma reconstrução do marxismo exclusivamente desde o ponto de vista da teoria de Gramsci, depois de décadas de “usos” (e abusos) do pensamento do comunista italiano.Neste sentido, uma recuperação do pensamento de Gramsci que tenta apresenta-lo como uma alternativa, tanto frente ao trotskismo como al stalinismo, tem o limite de que ao não tomar criticamente e em profundidade a questão político-estratégica, que inclui as lições da Terceira Internacional e a luta contra sua burocratização, luta essa encabeçada por Leon Trotsky, assim como as elaborações teórico-políticas e estratégias do fundados da IV Internacional, sempre pode ser passível de voltar a ser “instrumentalizada”, em termos políticos “eurocomunista”, para além das intenções de seu autor. * O presente artigo é uma síntese e reelaboração de diversos trabalhos escritos junto com Fernando Rosso na revista Ideas de Izquierda, assim como outras contribuições do autor publicadas em losgalosdeasterix.blogspot.comNotas1. Leiden-Boston, Brill, 2009.2. Aclaración: Todas las citas de los Cuadernos de la Cárcel, con número de Cuaderno y parágrafo, corresponden a Gramsci, Antonio. Quaderni del carcere. Edizione critica dell’ Gramsci a cura di Valentino Gerratana, Einaudi Tascabili, Torino/Italia, 2001.3. Thomas, Peter D., The Gramscian Moment. Philosophy, Hegemony and Marxism, Brill, Leiden-Boston, 2009, p. 93. Traducción propia.4. Thomas, Peter D., ob. cit., p. 137.5. Buci-Glucskmann, Christinne, Gramsci y el Estado, Siglo XXI España Editores, Madrid, p. 93.Arquivo
Hegemony and power : on the relation between Gramsci and Machiavelli / Benedetto Fontana.
Odeio os indiferentes: escritos de 1917 / Antonio Gramsci
EPUB"Todo grupo social, ao nascer do terreno originário de uma função essencial no mundo da produção econômica, cria também, organicamente, uma ou mais camadas de intelectuais que conferem homogeneidade e consciência da própria função não apenas no campo econômico, como também no social e político: o empresário capitalista gera junto consigo o técnico da indústria, o cientista da economia política, o organizador de uma nova cultura, de um novo direito etc..." (GRAMSCI, 2003:53) da wikipedia:Hegemonia e bloco hegemônicoGramsci é famoso principalmente pela elaboração do conceito de hegemonia e bloco hegemônico, e também por focar no estudo dos aspectos culturais da sociedade (a chamada superestrutura no marxismo clássico) como elemento a partir do qual poder-se-ia realizar uma ação política e como uma das formas de criar e reproduzir a hegemonia. Alcunhado em alguns meios como "o marxista das superestruturas", Gramsci atribuiu um papel central à separação entre infraestrutura (base real da sociedade, que inclui forças produtivas e relações sociais de produção) e superestrutura (a ideologia, constituída pelas instituições, sistemas de ideias, doutrinas e crenças de uma sociedade), a partir do conceito de "bloco hegemônico". Segundo esse conceito, o poder das classes dominantes sobre o proletariado e todas as classes dominadas dentro do modo de produção capitalista não reside simplesmente no controle dos aparelhos repressivos do Estado. Se assim fosse, tal poder seria relativamente fácil de derrocar (bastaria que fosse atacado por uma força armada equivalente ou superior que trabalhasse para o proletariado). Este poder é garantido fundamentalmente pela "hegemonia" cultural que as classes dominantes logram exercer sobre as dominadas, através do controle do sistema educacional, das instituições religiosas e dos meios de comunicação. Usando deste controle, as classes dominantes "educam" os dominados para que estes vivam em submissão às primeiras como algo natural e conveniente, inibindo assim sua potencialidade revolucionária. Assim, por exemplo, em nome da "nação" ou da "pátria", as classes dominantes criam no povo o sentimento de identificação com elas, de união sagrada com os exploradores, contra um inimigo exterior e a favor de um suposto "destino nacional" de uma sociedade concebida como um todo orgânico desprovido de antagonismos sociais objetivos. Assim se forma um "bloco hegemônico" que amalgama a todas as classes sociais em torno de um projeto burguês. O poder hegemônico combina e articula a coerção e o consenso....A supremacia de um grupo social se manifesta por dois modos: primeiro, pelo domínio e, segundo, pela direção intelectual e moral. Um grupo social domina os grupos adversários que tenda liquidar ou a submeter inclusive com a força armada e dirige os grupos afins e aliados. Um grupo social pode e deve ser dirigente antes de conquistar o poder governamental: esta, aliás, é uma das condições principais para a própria conquista do poder. Posteriormente, quando exerce o poder, torna-se dominante, mas deve continuar sendo dirigente também.Analisando o processo do Risorgimento, Gramsci considera que a função de classe dirigente ficou com o Piemonte, ainda que existissem na Itália núcleos de classe dirigente favoráveis à unificação, "estes núcleos nada queriam dirigir, isto é, não queriam conciliar seus interesses e aspirações com os de outros grupos. Queriam dominar, não dirigir e, todavia, queriam que seus interesses prevalecessem, não suas próprias pessoas, isto é, queriam que uma força nova, independente de todo compromisso e condição, se tornasse árbitra da Nação: esta força foi Piemonte", que teve uma função comparável a de um partido. "Este fato é da máxima importância para o conceito de revolução passiva, pois não foi um grupo social o dirigente de outros grupos, sim um estado, ao mesmo tempo limitado como potência e dirigente do grupo que deveria ser dirigente e pudesse pela disposição deste um exército e uma força político-diplomática... É um dos casos nos quais se tem a função de domínio e não de direção destes grupos, ditadura sem hegemonia."
As classes subalternasA hegemonia é, portanto, o exercício das funções de direção intelectual e moral unida àquela do domínio do poder político. O problema para Gramsci está em compreender como pode o proletariado ou em geral uma classe dominada, subalterna, tornar-se classe dirigente e exercer o poder político, ou seja, converter-se em uma classe hegemônica. As classes subalternas – subproletariado, proletariado urbano, rural e também a pequena burguesia – não estão unidas e sua união ocorre somente quando "se convertem em Estado", quando chegam a dirigir o Estado, de outra forma desempenham uma função descontinua e desagregada na história da sociedade civil dos estados singulares. Sua tendência à unificação "se despedaça continuamente por iniciativa dos grupos dominantes" dos quais elas "sofrem sempre a iniciativa, ainda quando se rebelam e se insurgem". A hegemonia é exercida unindo-se um bloco social – criando então a aliança política de um conglomerado de classes sociais diferentes. Na Itália, o bloco social não é homogêneo, sendo formado por industriais, proprietários rurais, classes médias e parte pequena da burguesia. Este bloco é, portanto, sempre entrecortado por interesses divergentes. Mas, mediante uma política, uma cultura e uma ideologia ou um sistema de ideologias, impedem que os conflitos de interesses, permanentes até quando são latentes, explodam, provocando a crise da ideologia dominante e uma decorrente crise política do sistema de poder. A crise da hegemonia se manifesta quando, ainda que mantendo o próprio domínio, as classes sociais politicamente dominantes não conseguem mais ser dirigentes de todas as classes sociais, isto é não conseguem resolver os problemas de toda a coletividade e a impor a toda a sociedade a própria complexa concepção do mundo. A classe social subalterna, se consegue indicar soluções concretas aos problemas deixados sem solução, torna-se dirigente e, expandindo sua própria cosmovisão a outros estratos sociais, cria um novo bloco social, que se torna hegemônico. Para Gramsci, o momento revolucionário volta-se inicialmente para o nível da superestrutura, em sentido marxista, isto é, político, cultural, ideal, moral. Mas, trespassa a sociedade em sua complexidade, indo ao encontro com sua estrutura econômica, isto é, todo o bloco histórico— termo que para Gramsci indica o conglomerado da estrutura e da superestrutura, as relações sociais de produção e seus reflexos ideológicos.
... O príncipe de Maquiavel "não existia na realidade histórica, não se apresentava ao povo italiano de modo imediato e objetivo. Era uma pura abstração doutrinária, o símbolo do chefe, do líder ideal. Mas os seus elementos passionais, míticos... se resumem e se tornam vivos ao final, na invocação de um príncipe realmente existente" ...Assim como o Estado, que na sociedade política almeja unir os intelectuais tradicionais com os orgânicos, também, na sociedade civil, o partido político forma "os próprios componentes, elementos de um grupo social que nasce e se desenvolve como econômico, até convertê-los em intelectuais políticos qualificados, dirigentes, organizadores de todas as atividades e as funções inerentes ao desenvolvimento orgânico de uma sociedade integral, civil e política". A necessidade de criar uma cultura própria dos trabalhadores relaciona-se com o apelo de Gramsci por um tipo de educação que permite o surgimento de intelectuais que partilhem das paixões das massas de trabalhadores. Neste aspecto, os adeptos da educação de adultos popular tomam Gramsci como uma referência. Seu sistema educacional pode ser definido dentro do âmbito da pedagogia crítica e a educação popular teorizadas e praticadas mais contemporaneamente pelo brasileiro Paulo Freire. ...Gramsci, desde os anos universitários, foi um decidido opositor da concepção fatalista e positivista do marxismo - presente no velho Partido Socialista Italiano -, segundo a qual o capitalismo necessariamente estava destinado a cair, dando lugar a uma sociedade socialista. ...Por si mesmas as sociedades não se transformam. Marx notara que nenhuma sociedade enfrenta questões sem que já possua, ou esteja em vias de obter, as condições de solucioná-las. Nem tampouco se desfaz uma sociedade sem que primeiro tenha desenvolvido todas as formas de vida nela subjacentes. Ao revolucionário se coloca o problema de identificar com exatidão as relações entre infraestrutura e superestrutura para chegar a uma análise correta das forças que operam na história de um determinado período. A ação política revolucionária, a práxis, para Gramsci é outrossim uma catarse que indica a "passagem do momento meramente econômico (ou egoísta-passional) ao ético-político, que é a elaboração superior da estrutura em superestrutura na consciência humana. Isto equivale também à transição 'do objetivo para o subjetivo' e da 'necessidade para a liberdade'. A infraestrutura, que, pela força exterior que oprime o homem, assimila-o a si mesma, tornando-o passivo, se transforma assim em meio de libertação, em instrumento para criar uma nova forma ético-política, em causa de novas iniciativas. A fixação do momento 'catártico' torna-se então, segundo me parece, o ponto de partida de toda filosofia da práxis. O processo catártico coincide com a cadeia de sínteses que resultam do desenvolvimento dialético." ...O Estado e a sociedade civilA teoria da hegemonia de Gramsci está ligada à sua concepção do Estado capitalista, que, segundo afirma, exerce o poder tanto mediante a força quanto o consentimento. O Estado não deve ser entendido no sentido estreito de governo. Gramsci divide-o entre a sociedade política, que é a arena das instituições políticas e do controlo legal constitucional, e a sociedade civil, que se vê comummente como uma esfera 'privada' ou 'não-estatal', e que inclui a economia. A primeira é o âmbito da força e a segunda o do consentimento. ...Seguindo Maquiavel, Gramsci argumenta que o 'Príncipe moderno' -o partido revolucionário- é a força que permitirá que a classe operária desenvolva intelectuais orgânicos e uma hegemonia alternativa dentro da sociedade civil. Para Gramsci, a natureza complexa da sociedade civil moderna implica que a única táctica capaz de minar a hegemonia da burguesia e chegar-se ao socialismo é uma 'guerra de posições' (análoga à guerra de trincheiras), A 'guerra em movimento' (o ataque frontal) levado a cabo pelos bolcheviques foi uma estratégia mais apropriada à sociedade civil 'primordial' existente na Rússia Czarista.
De Rousseau a Gramsci: ensaios de teoria política / Carlos Nelson Coutinho
VídeoUma teoria é uma crença e um hábito mental. A esfera da cultura se consitui a partir do compartilhamento dessas crenças, desses símbolos, que são tipos de signos gerais coletivos. O símbolo nos permite contar e inventar histórias, assim como pensar em coisas que ainda não existem (criatividade).Paradigma (ou movimentos hegemônicos) é como uma lente que nos permite organizar o mundo, pois a partir dela podemos entender os comportamentos à luz do movimento preponderante as crenças coletivas de uma época. A hegemonia se dá a partir da capilarização (estruturas menores) de uma visão de mundo (arcos fundantes). Como um fractal, que replica nas microestruturas as mesmas relações holísticas estruturantes, no caso, de poder.A análise do discurso implica em observar a estrutura maior que embasa os comportamentos.Hegemonia dos Estados Unidos sendo confrontada pela China. A revolução do 5G McLuhanA maneira como você organiza a sua cognição é que vai determinar as suas relações de poderÉ muito menos importante o que está sendo dito mas quais são as estruturas sintáticas e quais são os meios disponiblizados para aquilo que está sendo dito. Ou seja, a gente não deve se perder tanto na análise de conteúdo, mas entender como a adoção de certas tecnologias formata nossa cognição e a gente passa a pensar a partir dessa formatação. A gente acha que tem total livre-arbítrio pra pensar o que nós quisermos, quando na verdade quando você adota uma estrutura cognitiva aquilo que pode ser pensado já está em grade parte determinado por essa estrutura.O meio é a massagem (!)
A hegemonia carolíngeaAbadias se transformando em centros difusores do conhecimento e sendo a origem das universidades modernas Guelfos e guibelinos
O desenvolvimento cultural (a prensa de gutenberg) e o uso da abstração deram início a uma nova forma de pensar Hegemonia eletrônica e o soft power americano Hegemonia digital - big data - iot - ai - computação ubíqua Provocação: personagens citados masculinos
ArquivoResenha Morin almeja "sensibilizar para as enormes carências do nosso pensamento e fazer compreender que um pensamento mutilador conduz necessariamente a ações mutiladoras" (p. 22).O autor parisiense identifica algumas patologias de simplificação do saber:• A antiga, que dava vida independente aos mitos e aos deuses;• A moderna, a inteligência cega, da hipersimplificação do real;• A do idealismo, que oculta a realidade e se considera a único real;• A da teoria, que está voltada para o dogmatismo, para o doutrinismo;• A da razão, que encerra o real em um sistema de ideias coerentes ignorando a ação dialógica da racionalidade.A teoria da complexidade apóia-se inicialmente e avança a partir das concepções teóricas dos sistemas, da organização, da informação e da cibernética, porque:• Considera que o conhecimento não se reduz a incerteza (a informação);• Compreende incertezas, indeterminações e fenômenos aleatórios como o progresso do conhecimento (sistema aberto);• A concepção do conhecimento está associada aos pressupostos da organização, da auto-organização e da desordem;• Compreende o mundo como horizonte de realidades mais vastas;• Reconhece a sociedade, o conhecimento, o ser humano como um sistema aberto;• O sujeito e o mundo interagem e se desenvolvem. Reconhecem-se como um siste-ma aberto de interações e revitalização.Para Morin, o pensamento complexo supõe o mundo como um horizonte de um ecossis-tema, e reconhece o sujeito, como um ser pensante (último desenvolvimento da complexi-dade auto organizadora). Para o autor, “o mundo está no interior de nossa mente, que está no interior do mundo. Sujeito e objeto nesse processo são constitutivos um do outro” e in-separáveis através de um sistema auto organizado/ecossistema. Este sujeito se reconhece no ecossistema e deve ser integrado em um metassistema (horizonte de realidades mais vasto), conforme destaca Edgar,O sujeito deve permanecer aberto, desprovido de um princípio dedecidibilidade nele próprio; o objeto deve permanecer aberto, de um lado sobre o sujeito, de outro lado sobre seu meio ambiente, que por sua vez, se abre necessariamente e contínua abrir-se para além dos limites de nosso entendimento (p.68).Nesta relação com o mundo, com o ecossistema social, o conhecimento chega a uma in-certeza irredutível, "uma brecha intransponível no acabamento do conhecimento" (p.68). Sempre aparece um novo conhecimento, e com ele incertezas, o desconhecido, a partir da relação com o metassistema.O autor distingue razão, de racionalidade e racionalização:• A razão: aspecto lógico que corresponde à visão coerente dos fenômenos, das coisas e do universo;• A racionalidade: é o diálogo incessante entre o nosso espírito que cria estruturas ló-gicas e que as aplica e dialoga com o mundo real;• Racionalização: consiste em querer encerrar o mundo em um sistema coerente. O que se contradiz a isto é visto como ilusão ou aparência. Explicação simplista.O autor destaca três princípios interligados que podem nos ajudar a pensar a complexi-dade:• Dialógico: permite manter a dualidade no seio da unidade. Associa ao mesmo tempo termos complementares e antagônicos. Exemplo: a ordem e a desordem;• Recursão Organizacional: "a ideia recursiva é,portanto, uma ideia em ruptura com a idéia linear de causa e efeito, de produto/produtor, de estrutura/superestrutura, já que tudo o que é produzido volta sobre o que produz num ciclo ele mesmo auto constitu-tivo, auto organizador e autoprodutor" (p.108).• Hologramático: perpassa a ideia de que não apenas a parte está no todo, mas o todo está na parte. Imobiliza o espírito linear, pois o movimento produtor do conhecimento se enriquece através do conhecimento das partes pelo todo e do todo pelas partes (re-lação antropossocial). Ele não conceitua o paradigma da complexidade, apenas aponta que é uma tarefa cultural, histórica, profunda e múltipla.Os seres humanos, a sociedade, as instituições são ao mesmo tempo máquinas triviais e não triviais. Não triviais, pois nem todos os comportamentos são previsíveis, mas o ser hu-mano é também trivial, de certa maneira, pois alguns comportamentos podem ser previsí-veis. O importante são os momentos de crise em que a máquina se comporta de certa forma, na qual não se pode prever. É um acréscimo de incertezas. As desordens ameaçam, as regu-lamentações falham e é preciso abandonar os programas, que geralmente consistem em anti-gas soluções. Torna-se importante ser estratégico e elaborar novas soluções. O pensamento complexo não recusa a clareza, a ordem e o determinismo. Os considera insuficiente, pois sabe que a descoberta, o conhecimento e a ação não podem ser programados. É preciso es-tar alerta que o novo pode e vai surgir. É o ponto de partida para uma ação mais rica e me-nos mutiladora.No capítulo cinco, a complexidade é tratada a partir do cotidiano das pessoas, no trabalho e na vida em sociedade. Morin inicia essa exposição comparando, metaforicamente, a com-plexidade da tapeçaria, com diversos tipos de fios, a uma organização onde cada um, de forma sintética, concorre para o conjunto. O autor subdivide em três etapas da complexida-de, que em resumo descreve-as da seguinte forma:• A tapeçaria é mais que a soma dos fios que a constituem, isto é, que o todo é mais que a soma das partes;• A tapeçaria em seu conjunto inibe a expressão da qualidade dos fios, ou seja, o todo é tão menor que a soma das partes;• O todo é mais e menos que a soma das partes.A visão simplificada diria: a parte está no todo. Em contrapartida a visão complexa diz que não somente a parte está no todo, mas o todo está na parte.A organização, o mercado e todo o uni-verso corresponde a uma mistura de ordem, de desordem e de organização. Não se pode afastar o incerto, o imprevisto e a desordem. Num universo de pura ordem, não haveria inovação, evolução. Em contrapartida, em um universo de pura desordem, não haveria estabili-dade para se buscar a organização. A desordem se constitui uma resposta inevitável ao cará-ter sistemático, abstrato e simplificador da ordem. Não há receita de equilíbrio e sim diante da degeneração (da desordem) buscas constantes de regeneração (ordem).• No que situa como mal-entendido Morin esclarece que, a ideia de complexidade comporta a impossibilidade de unificar, da incerteza, da irresolubilidade de frente a frente com o indizível. Todavia alerta para que não seja confundida com o relativismo absoluto. Reafirma que a busca da totalidade é uma verdade, mas reconhece a veraci-dade da impossibilidade desta totalidade. A ideia de complexidade é a aventura indefi-nida ou infinita do conhecimento;• Ele considera que navega entre a ciência e a não ciência. Navega na destruição dos fundamentos da ciência. Acredita em um pensamento menos mutilador e mais racional possível. Respeita as exigências de investigação, de verificações do conhecimento cien-tífico e de reflexão do conhecimento filosófico;• Critica ao ser considerado "vulgarizador", por duas razões: primeiro porque tenta discutir as ideias à medida que as compreende, assimila e as reorganiza. E segundo, porque se situa ao nível das ideias gerais, fazendo comunicar os saberes específicos a ideia geral. Almeja um caminho em que sejam possíveis a reorganização e o desenvol-vimento do conhecimento. Salienta que se está na era da pré-história do espírito hu-mano. E assim se abre a possibilidade para o futuro, caso a humanidade tenha futuro;• Reafirma que a complexidade é um desafio e não uma resposta. Porque comporta imperfeições, incerteza e reconhecimento do irredutível; a simplificação é necessária, mas deve ser relativizada; é a alternativa de escapar do pensamento redutor (que só vê os elementos) e do global (que apenas vê o todo); aceita a contradição e a incerteza e a dialógica relação entre a ordem/desordem/organização;• Adverte que a ciência progrediu porque é efetivamente complexa, pois se funde no consenso e no conflito. Caminha sobre quatro tripés conflitivos: a racionalidade, o em-pirismo, a imaginação e a verificação;• O autor analisa as críticas recebidas diante dos princípios da or-dem/desordem/organização.Salienta que se faz necessário à interação. Propõe um te-tragrama (ordem/desordem/interação/organização). É preciso misturar e combinar esses princípios, sendo eles interdependentes e nenhum tendo prioridade sobre o ou-tro. A complexidade é o progresso da ordem, da desordem e da organização. A com-plexidade muito alta da desordem gera liberdade e da ordem, regulação;• Distingue sabedoria, conhecimento e informação. Sabedoria é reflexiva; o conheci-mento é organizador e a informação se apresenta em formas de unidades rigorosamen-te designáveis. O conhecimento como uma organização viva é ao mesmo tempo um sistema aberto e fechado. Possui uma separação com o mundo exterior e consigoMesmo;• Conhecer é a produção da tradução das realidades do mundo exterior. Neste pro-cesso os seres humanos são coprodutores dos objetos que se conhece. A objetividade é um produto que diz respeito a subjetividade. A teoria objetiva do sujeito a partir da au-to-organização permite conhecer diferentes desenvolvimentos da subjetividade do su-jeito;• A ideologia para Morin é considerada neutra; um sistema de ideias. É reduzir uma teoria, uma doutrina, uma filosofia ao grau zero;• Apresenta algumas percepções da importância da relação da ciência com a filosofia através do qual a reflexão por si só era incapaz de aceitar. Tece críticas da relação da ci-ência com a sociedade que sofre a determinação tecnoburocrática da organização in-dustrial do trabalho. Reconhece a sua limitação teórica da relação da ciência com a psi-cologia no tocante a teoria de Piaget;• Finalizando, se reconhece como um racional, mas compartilha de uma razão evolu-tiva. Aponta a racionalização como o maior inimigo da razão e reafirma que a verdadei-ra racionalidade reconhece a irracionalidade e dialoga com o irracionalizável;• Conclui sua explanação, que como um organismo vivo a humanidade tem vários começos, e que haja novos nascimentos. Salienta que a civilização está vivendo na "idade de ferro planetária", o que indica que todas as culturas, todas as civilizações es-tão em comunicação, mas ao mesmo tempo vive-se as barbáries entre as relações de raças, culturas e etnias. O ser humano está nesta era e ainda não sabe como sair dela. Ressalta a ideia que ainda se está na pré-história do espírito humano, na era da barbárie das ideias, pois se está submetido a modos mutiladores e disjuntivos do pensamento, muito distante de pensar de forma complexa. Enfatiza que sua teoria é um apelo para a civilização das ideias. Vive-se na barbárie das ideias, pois não se sabe conviver com as ideias e nem com as teorias.
Da necessidade de um pensamento complexo / Edgar Morin
ArquivoO problema do conhecimento é um desafio porque só podemos conhecer, como dizia Pascal, as partes se conhecermos o todo em que se situam, e só podemos conhecer o todo se conhecermos as partes que o compõem. Ora, hoje vivemos uma época de mundialização, todos os nossos grandes problemas deixaram de ser particulares para se tomar mundiais: o da energia e, em especial, o da bomba atômica, da disseminação nuclear, da ecologia, que é o da nossa biosfera, o dos vírus, como a Aids, imediatamente se mundializam. Todos os problemas se situam em um nível global e, por isso, devemos mobilizar a nossa atitude não só para os contextualizar, mas ainda para os mundializar, para os globalizar; devemos, em seguida, partir do global para o particular e do particular para o global, que é o sentido da frase de Pascal: "Não posso conhecer o todo se não conhecer particularmente as partes, e não posso conhecer as partes se não conhecer o todo".
EUA & China: Duas estratégias na luta pela hegemonia / Samuel Pinheiro Guimarães
ArquivoA nova guerra pela hegemonia culturalhttps://outraspalavras.net/geopoliticaeguerra/eua-china-duas-estrategias-na-luta-pela-hegemonia/ texto na íntegra:EUA & China: Duas estratégias na luta pela hegemoniaSamuel Pinheiro Guimarães Publicado 12/05/2020 às 14:44 - Atualizado 12/05/2020 às 14:50 Imagem: South China Morning Post1-O fenômeno político, econômico e militar mais importante, anterior à emergência do coronavírus e que, após o fim da pandemia, permanecerá, é a firme disposição dos Estados Unidos de manter sua hegemonia mundial, seu poder de Império, face à ascensão e à competição chinesa.2-A hegemonia em nível mundial é a capacidade de elaborar, divulgar e fazer aceitar pela maioria dos Estados uma visão do mundo em que o país hegemônico é o centro; de organizar a produção, o comércio e as finanças mundiais de forma a captar para a sede do Império uma parcela maior do Produto Mundial para uso de sua população, e muito em especial de suas classes hegemônicas e de seus altos funcionários; a capacidade de impor a “agenda” da política internacional; a força para punir os Governos das “Províncias” do Império que se recusem a aceitar ou se desviem das normas (informais) de seu funcionamento.3-As normas (informais) que os Governos das “Províncias” (que são Estados nacionais) devem seguir são:-ter uma economia capitalista, aberta ao capital estrangeiro, com mínima intervenção estatal;-dar igualdade de tratamento às empresas de capital nacional e às de capital estrangeiro;-não exercer controle sobre os meios de comunicação de massa;-ter um regime político pluripartidário com eleições periódicas;-não celebrar acordos militares com Estados adversários, a saber Rússia e China;-apoiar as iniciativas dos Estados Unidos.4-Sempre que conveniente aos interesses do Império Americano estas normas são “flexibilizadas”, como, a título de exemplo, no caso de monarquias do Oriente Próximo.***5-Durante, após e desde a Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos, ao suceder o combalido Império Britânico, organizaram, em 1946, o sistema político mundial com as Nações Unidas e suas agências na Conferência de San Francisco; o sistema econômico, com o FMI, em 1944, para regular o sistema financeiro internacional, com base em taxas fixas de câmbio e no padrão ouro-dólar; o Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD, hoje Banco Mundial) criado em 1944 para financiar a reconstrução europeia; o Acordo Geral de Tarifas Aduaneiras e Comércio (General Agreement on Tariffs and Trade, o GATT), em 1947, para regular o comércio internacional com base na cláusula da nação mais favorecida; a Organização Mundial do Comércio (OMC), em 1994, que administra acordos sobre comércio de bens, de produtos agrícolas, de serviços, sobre investimentos e propriedade intelectual, e solução de controvérsias; e o Plano Marshall, em 1948, para, através de doações e de financiamentos a juros baixos, em valor atual de 100 bilhões de dólares; a reconstrução da Europa, conter a influência dos partidos comunistas e reativar a indústria americana de bens de capital; o sistema militar, com a OTAN, em 1949, que garantiu a presença de tropas americanas em bases na Europa Ocidental; os pactos regionais de defesa “mútua” como o TIAR, o Cento, a SEATO, o acordo com o Japão, o ANZUS (Austrália, Nova Zelândia, Estados Unidos); as bases militares, que fora do território americano são mais de 700; as sete Frotas, que patrulham os mares e oceanos; o Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP), em 1968, que estabelece um oligopólio nuclear que permite aos Estados Unidos, Grã-Bretanha, Rússia, França e China produzir, exportar, importar, armas e material nuclear e proíbe aos demais Estados; o sistema de “atração dos melhores cérebros” (que é o outro lado do “brain drain”) de todos os países e de geração de ciência e tecnologia; e o sistema mundial de formação da opinião pública e de interpretação da realidade, através dos meios audiovisuais e da Internet.6-Desde 1945, lograram os Estados Unidos e suas classes hegemônicas (o establishment?) extraordinárias vitórias. Executaram uma eficiente política externa bipartidária. Contribuíram para desmantelar os impérios coloniais francês, britânico, holandês e português, através da ONU, e por ações de apoio a movimentos de independência; não objetaram a abertura da China ao capital megamultinacional, em apoio implícito às políticas de Deng Xiaoping; desintegraram a União Soviética com o auxílio de M. Gorbachev e Boris Ieltsin; obtiveram a aceitação como “natural”, pelos países subdesenvolvidos, da divisão de trabalho entre produtores de matérias primas e produtores industriais; superaram as crises de 2001 e 2008; eliminaram (assassinaram?) Bin Laden e assim vingaram o crime de lesa majestade cometido em 2001; mantiveram esmagadora supremacia militar e nuclear.7-A China realizou extraordinários feitos desde 1945. O Exército de Libertação Popular e o Partido Comunista Chinês venceram e expulsaram os exércitos invasores japoneses; derrotaram e puseram em fuga Chiang Kai Shek, o Kuomintang (Partido Nacionalista Chinês), junto com seu exército de dois milhões de soldados para Taiwan; estruturaram o Estado socialista chinês; enfrentaram os Estados Unidos na Guerra da Coreia sem serem derrotados (1950 a 1953); detonaram sua primeira bomba atômica em 1964; obtiveram o reconhecimento diplomático americano; em 1971 ingressaram no Conselho de Segurança e nas agências da ONU no lugar de Taiwan; fizeram a reforma agrária e com amplos movimentos populares romperam as estruturas elitistas herdadas da China imperial e que tinham permanecido durante a China republicana (1911-49); superaram os efeitos do cisma com a URSS, em 1960; auxiliaram o Vietnã em sua vitória final contra os Estados Unidos, em 1975; expandiram os sistemas de educação e saúde e reduziram a pobreza de forma eficaz e significativa, sendo hoje os chineses em situação de extrema pobreza menos de 1% de sua população. O seu míssil Dongfeng-41 desenvolve velocidade de 8.500 m/segundo superior em 25 vezes a velocidade do som que é de 340 m/segundo e pode atingir alvos a 13.000 km, sem que haja arma comparável no arsenal americano.8-A China se recusou a fazer parte do Pacto de Varsóvia, assinado em 1955 entre os países do leste europeu, e rejeitou a política de coexistência pacífica de Kruschov (1953-1964) anunciada em 1955, a qual a China denunciou como “revisionista”. Em 1958, a China recusou solicitação soviética de uso de portos. A confrontação ideológica fez com que a União Soviética, em 1958, após a Segunda Crise do Estreito de Taiwan, temendo o confronto entre China e EUA, suspendesse a cooperação nuclear; revogasse a promessa de fornecer tecnologia para a construção de bomba atômica pela China e, em 1960, ordenasse a saída de todos os especialistas russos. A aproximação da China dos Estados Unidos, em 1972, fez com que as relações com a URSS se mantivessem distantes até a década de 1980 quando Gorbachev iniciou processo de aproximação que levaria a sua visita à China em 1989.9-No Império Americano os sistemas políticos, econômicos e militares estão em reformulação permanente para atender às suas necessidades internas e externas. Assim ocorreu nos episódios de abandono unilateral pelos Estados Unidos da paridade ouro-dólar; de tornar indefinida a vigência do TNP; da aceitação da Índia como potência nuclear; da reformulação da política externa desde 2016 pelo Governo de Donald Trump, com base nos conceitos de America First, de anti-multilateralismo, de desrespeito às decisões do Conselho de Segurança, de unilateralismo, de uso da violência, de negação da mudança climática.***10-Desde o remoto ano de 1607, quando foi fundada a vila de Jamestown, na Virginia, e depois, com a fundação de cada uma das Treze Colônias, os Estados Unidos da América têm a convicção de que cabe a eles liderar o mundo (e não apenas o Ocidente) como nação “indispensável” e “excepcional” por serem a mais antiga democracia, a mais rica e dinâmica economia, a mais poderosa potência militar, a mais benevolente e generosa nação, e aquela que organizou o sistema internacional depois dos desastres da Grande Depressão: o desemprego que chegou a 30% nos EUA; o nazismo com seus campos de extermínio e experiência humana, e trabalho escravo e sua doutrina de superioridade racial ariana; e a Guerra Mundial, quando morreram 50 milhões de pessoas.11-Os Estados Unidos da América, desde a Guerra da Independência em 1776 sempre estiveram em conflitos com outros Estados, numa longa prática de intervenção militar ao redor do mundo.12-A China que, com cinco mil anos, é a mais antiga civilização, sempre foi a maior economia e o mais poderoso Estado, ainda que humilhada pelas Potências ocidentais entre 1840 e 1949, com um amplo e pioneiro legado de inovações tecnológicas, sempre se manteve um Estado com economia e instituições organizadas, e uma sociedade de grande criatividade filosófica, artística e literária. Hoje, como República Popular, ostenta grande pujança econômica e tecnológica.13-A China raramente esteve em conflito militar com outros Estados e quando esteve foi como resultado de agressão externa, como o caso das agressões ocidentais e a invasão japonesa.***14-Deng Xiaoping definiu os requisitos indispensáveis para o desenvolvimento da China: estabilidade interna e ambiente de paz internacional.15-Os dirigentes da República Popular reiteram em todas as ocasiões que seu desenvolvimento é pacífico e cooperativo e a China se apresenta como um Estado que deseja participar das instituições internacionais e não destruí-las ou substituí-las, procurando, todavia, reformá-las.16-A China procura se apresentar como um parceiro confiável, pacífico, cooperativo em especial em relação aos países de sua vizinhança mais próxima. É importante mencionar que entre os principais investidores na China se encontram empresas de Taiwan e Hong Kong e as comunidades, prósperas e influentes, da Diáspora chinesa em vários países da Ásia, que somam cerca de 10 milhões de descendentes de chineses.***17-A partir de 1978, a reorientação radical, porém gradual e experimental, comandada por Deng Xiaoping da política econômica da República Popular da China com base na abertura externa, na atração do capital multinacional e na economia de mercado, foi possível graças à destruição (ou, pelo menos, ao forte abalo) das estruturas feudais e elitistas do Império chinês no período de Mao Zedong (1949-1976), quando o PIB da China cresceu à taxa anual de 4-5%.18-A China atrai anualmente, após os Estados Unidos, o segundo maior fluxo de investimento estrangeiro direto, promove intensa transferência de tecnologia, expande e diversifica suas exportações, cresceu à média de 10% ao ano entre 1978 e 2008 (trinta anos) e continua a crescer a taxas elevadas. Tornou-se a segunda maior economia do mundo, o maior país exportador e o segundo maior importador, detentor das maiores reservas internacionais (três trilhões de dólares), o maior investidor em títulos do Tesouro americano e grande gerador de tecnologia.***19-Xi Jinping tem insistido que o grande sonho chinês é a revitalização da cultura, do Estado e da civilização chinesa e a unidade do território, com a reincorporação de Taiwan e a realização do socialismo com características chinesas.20-A China tem duas metas temporais: a do centenário de fundação do Partido Comunista Chinês, em 2020, e a do centenário da Revolução Comunista, em 2049. A meta estabelecida para o centenário de 2020 era criar uma economia moderadamente próspera e a meta para o centenário de 2049 é atingir uma economia próspera e poderosa.***21-A China executa uma estratégia de política externa com as seguintes características e objetivos:– manter relações de não-confrontação em geral e, acima de tudo, evitar a confrontação militar com os Estados Unidos;– assegurar fontes diversificadas de matérias primas para a economia chinesa;– abrir mercados para as exportações e para os investimentos chineses;-não interferir em assuntos internos políticos ou econômicos dos países;– não impor condicionalidades políticas ou econômicas para a cooperação econômica nem fazer críticas sobre a situação de direitos humanos ou sobre o regime político de terceiros países;– fortalecer seus laços com os países vizinhos através da Organização de Cooperação de Shangai (SCO), do acordo com a ASEAN (Associação de Países do Sudeste Asiático) integrada por Brunei; Camboja; Indonésia; Laos; Malásia; Mianmar; Filipinas; Singapura; Tailândia; Vietnã; de acordos bilaterais com a Rússia e das obras de infraestrutura do Cinturão e Rota da Seda.22-A China desenvolve iniciativas de aproximação e programas de cooperação com os países africanos, com os países latino-americanos, com os países árabes e com os países que se encontram no que se chamou de Cinturão e Rota da Seda.23-Três iniciativas chinesas tiveram grande importância. A primeira foi a criação dos BRICS, em companhia da Rússia, da Índia, do Brasil e África do Sul. No âmbito dos BRICS foi criado, em 2014, o Novo Banco de Desenvolvimento para financiar projetos de infraestrutura e os Acordos de Reserva Contingente, para fazer face a dificuldades de balanço de pagamentos.24-A segunda, a Organização de Cooperação de Shangai (SCO), que foi fundada em 2001, com a Rússia, o Cazaquistão, o Tadjiquistão, Quirquistão e Uzbequistão, e da qual, em 2017, a Índia e o Paquistão se tornaram membros. Sua finalidade principal é a cooperação em matéria de segurança e de combate ao terrorismo, ao separatismo e ao extremismo.25-A terceira iniciativa foi a criação, em 2014, do Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura. A criação do Banco atraiu grande interesse europeu e suscitou a oposição americana. Todavia, metade dos países da OTAN e os grandes países asiáticos assinaram, à exceção do Japão. Seus membros fundadores mais importantes foram a Áustria, Reino Unido, Itália, Alemanha, Holanda, Nova Zelândia, Noruega, Austrália, China, Coreia do Sul, Paquistão, Rússia, Índia, África do Sul e Brasil.***26-Oito presidentes americanos, de Nixon a Obama, executaram uma estratégia de engajamento, baseada na convicção de que abraçando a China política e economicamente fariam com que ela se tornasse gradualmente mais capitalista e liberal.27-Essa estratégia criou a maior relação comercial entre dois países. Há cerca de 70 mil companhias americanas na China e, em 2005, iniciou-se um grande fluxo de estudantes chineses para os Estados Unidos, que são o maior grupo nacional de estudantes nos Estados Unidos.28-Assim, até a presidência de Barack Obama (2007-2015), a estratégia americana se fundava na visão de que o crescimento econômico chinês levaria à abertura política e à democracia e a uma convergência chinesa com as políticas ocidentais.29-Obama se proclamou o “primeiro presidente americano do Pacífico” (America’s First Pacific President). Sua política tinha como objetivo conter a ascensão da China que viria, em 2010, a ultrapassar o Japão e a se tornar a segunda maior economia do mundo.30-O fato de a China ter superado os Estados Unidos em produção industrial causou grave preocupação aos estrategistas americanos, pois estes consideram que a manufatura é a base da indústria e que uma manufatura forte permite um poder militar forte e, com ele, a capacidade de competir pela hegemonia global.31-A ênfase na Ásia (rebalance to Asia-Pacific), slogan da política externa de Obama, era sustentada por quatro pilares: a alocação de 60% da força naval e aérea americana para a Ásia; a negociação da Trans-Pacific Partnership, com exclusão da China; a exploração das disputas da China com seus vizinhos; a manutenção do contato com a China.32-Em termos de paridade de poder de compra (PPP) a China superou os Estados Unidos como maior economia do mundo em 2014; em 2016 o Produto real (GDP) chinês era 12% maior que o americano e, em 2015, o produto manufatureiro chinês foi 150% maior. Em cada um dos cinco anos até 2016, a China foi o primeiro país em pedidos de patentes.33-Os Estados Unidos negociaram acordos militares com países da região como o Japão, a Coreia do Sul, a Austrália, as Filipinas. Na área econômica negociaram, sigilosamente e fora da OMC, o TransPacífic Partnership Agreement (TPP), entre 12 países, entre os quais se destacam EUA, Japão, Canadá, Austrália, México e Vietnã, amplo acordo de livre comércio e de normas em muitas áreas, em um esquema de normas OMC-Plus e mesmo KAFUS-Plus, (acordo Coreia do Sul-Estados Unidos).34-A negociação do TPP procurava isolar a China de seus vizinhos próximos. Os Estados Unidos, ademais, insistiam em suas críticas à situação de direitos humanos e ao regime político chinês, acusado de ditatorial, provocando irritação nas autoridades chinesas enquanto sua política de venda de armas a Taiwan e estímulo à sua independência contrariava seus compromissos.35-A estratégia de Obama de ênfase na Ásia não só fracassou como fez aumentar as desconfianças do Governo da China e o estimulou a tentar contrabalançar a ação americana com iniciativas tais como a Parceria Econômica Abrangente; a Área de Livre Comércio da Ásia-Pacifico; o projeto de Um Cinturão, uma Rota, e a criação do Banco dos BRICS e do Banco Asiático de Infraestrutura. De outro lado, a China tem continuado a expandir sua presença em altos cargos de organismos como o FMI, o Banco Mundial e as Nações Unidas.36-Um conceito estratégico foi proposto por Xi Jinping a Obama em 2013: não ao conflito e não à confrontação; respeito mútuo; cooperação ganha-ganha (win-win). Os Estados Unidos não aceitaram nem rejeitaram este conceito de Xi Jinping para reger as relações China/Estados Unidos.***37-Barack Obama foi sucedido em 2016 por Donald Trump, assumidamente um “outsider” (estranho) em relação à política e ao próprio Partido Republicano, e que provocou uma reviravolta, inclusive emocional e voluntarista, na condução da política externa americana e, em especial, quanto à China.38-Seu lema America First resume sua visão antagônica em relação a compromissos e organismos internacionais, às negociações multilaterais, em relação à não intervenção política. Trump tende a considerar que a política externa é, em realidade, uma negociação comercial em que ele, Trump, acredita que prevalecerá por ter maior experiência como homem de negócios.39-Donald Trump identificou a China não só como competidora, mas também como a principal adversária econômica, política e militar dos Estados Unidos e que tem de ser tratada com firmeza.40-A abordagem de confrontação de Trump atraiu surpreendente apoio bipartidário. Os empresários americanos passaram a se queixar do roubo de segredos comerciais, de transferência forçada de tecnologia e dos subsídios às empresas chinesas que tornavam a competição impossível. E os políticos denunciaram as prisões de ativistas de direitos humanos e de lideranças de minorias étnicas.41-A estratégia de Donald Trump de decoupling (desconexão) da China para contenção do crescimento econômico e político chinês tem como objetivos:– eliminar o déficit comercial bilateral dos EUA, de cerca de US$ 360 bilhões anuais;– impedir a transferência, por empresas americanas e europeias, de tecnologia avançada;-reduzir a presença de estudantes chineses nos EUA, que seriam 370 mil em 2019, dez vezes o número de 2009;– impedir a adoção da tecnologia 5G da Huawei;– promover o retorno da produção industrial e de empregos para os Estados Unidos;– expandir o orçamento e a presença militar na Ásia;– alinhar os países europeus com os Estados Unidos contra a China.42-Em março de 2018, Trump declarou que “guerras comerciais são boas e fáceis de vencer” e aumentou tarifas sobre aço e alumínio importados da China. Beijing retaliou com tarifas sobre exportações americanas.43-Em setembro de 2018, um navio de guerra chinês e um navio americano chegaram a 50 metros um do outro no Mar do Sul da China e quase colidiram.44-Em outubro de 2019 os Estados Unidos colocaram em “lista negra” empresas de tecnologia e dirigentes do Partido Comunista Chinês pelo seu envolvimento na prisão de muçulmanos em Xinjiang.45-O Secretário de Estado Mike Pompeo declarou que a América e seus Aliados deveriam assegurar que a “China mantivesse apenas seu lugar próprio no mundo”. Pompeo declarou que a “China quer ser a potência econômica e militar dominante no mundo, disseminando sua visão autoritária da sociedade e suas práticas corruptas”.46-Em março de 2019, o Comitê do Perigo Presente, dos anos 50, foi reativado e um de seus integrantes, Newt Gingrich, que foi Presidente da Câmara de Representantes, republicano e conservador, publicou o livro Trump vs. China e apontou a China como a maior ameaça aos Estados Unidos, muito maior do que fora a Alemanha nazista ou a União Soviética.47-Donald Trump:– taxou em 100% as importações chinesas, usando o argumento de segurança nacional, em violação dos compromissos assumidos pelos EUA na OMC;– bloqueou o funcionamento do mecanismo de solução de controvérsias da OMC;– retirou os EUA da Trans Pacífic Partnership;-proibiu a venda de empresas americanas de alta tecnologia;– pressionou os países europeus a se alinhar com sua política anti-China;– denunciou as despesas militares chinesas como exageradas e provocativas;– renovou os tratados de aliança militar com o Japão e a Austrália;– retirou os EUA do Acordo de Paris sobre mudança climática;– publicou uma lista de dezenas de empresas chinesas, entre elas a Huawei, com as quais as empresas americanas não podem fazer negócios. A China, em retaliação, fez uma lista semelhante de empresas americanas.***48-Em janeiro de 2020, foi assinada a Fase 1 do acordo comercial entre China e Estados Unidos que prevê:– cancelamento de tarifas que passariam a vigorar em 15/12/19 e incidiriam sobre US$ 160 bilhões de produtos chineses;– redução de 15% para 7,5% das taxas sobre outros produtos no valor total de US$ 120 bilhões importados da China;– foram mantidas as tarifas americanas de 25% sobre US$ 250 bilhões em produtos importados da China;– a China assumiu o compromisso de comprar US$ 200 bilhões de produtos agrícolas, de energia e manufaturas americanas até 2021;– o acordo inclui seções sobre propriedade intelectual, transferência forçada de tecnologia, alimentos, finanças, moeda, câmbio e solução de disputas.49-Estão em curso as negociações da Fase 2 do acordo comercial.***50-Em 2018, a China superou a duração da URSS (1917-1991) e se tornou o mais antigo Estado comunista sobrevivente.51-A comunidade de inteligência americana espiona governos estrangeiros desde a organização na Segunda Guerra do Office of Strategic Services (OSS), precursor da CIA. Hoje, a China faz o mesmo, sob veementes protestos americanos.52-O governo chinês tem condicionado a presença de companhias americanas a programas de transferência de tecnologia. Empresários, inicialmente entusiastas das relações com a China, vieram a se tornar críticos veementes.53-A principal área de competição entre China e Estados Unidos é pela liderança da próxima geração de tecnologias. Inicialmente os executivos do Silicon Valley minimizaram o desafio chinês em tecnologia, argumentando que controles rígidos na política e na educação na China iriam impedir inovações radicais. Mas esta sua visão não mais prevalece.54-No plano “Made in China 2025” foram destinados bilhões de dólares em subsídios à pesquisa para ajudar as companhias chinesas a superar seus competidores em áreas de fronteira como veículos elétricos e robótica. De seu lado, como percentagem da economia, o investimento federal nos Estados Unidos em pesquisa caiu a seu menor nível desde 1955.55-Em maio de 2019, o Departamento do Comércio proibiu a Huawei de comprar microchips americanos o que prejudicou sua capacidade de produzir smartphones e equipamentos de rede (networking). Os Estados Unidos solicitaram a 61 países que proibissem o uso de equipamento da Huawei, mas somente três atenderam ao seu pedido: Austrália, Nova Zelândia e Japão.56-O sistema 5G é a futura geração de telecomunicação móvel. Cinco empresas vendem equipamentos e sistemas 5G para operadoras: Huawei, ZTE, Nokia, Samsung e Ericsson. Diante da forte campanha contrária americana, que alega riscos para a segurança nacional dos Estados, a China tem desenvolvido intensos esforços diplomáticos para fazer com que o sistema da Huawei de 5G para telefonia venha a ser adotado em especial pelos países europeus.57-Os Estados Unidos não dispõem de uma tecnologia alternativa 5 G para competir com a China.58-A imprevista pandemia do coronavírus criou uma oportunidade para a China prestar auxílio aos países europeus atingidos, em especial à Itália e à Espanha e demonstrar sua eficiência, como Estado, pela capacidade de controlar a Pandemia com medidas eficazes e rápidas, sofrendo a China relativamente poucos contágios e mortes, suscitando uma comparação com os Estados Unidos, a esses desfavorável.***59-Dificilmente a estratégia de “decoupling” de Donald Trump poderia ser bem-sucedida. A renda total das companhias americanas na China, em 2017, foi de US$ 544 bilhões. Algumas companhias estão construindo fábricas na Índia, no Vietnã e no México, mas a maioria das companhias americanas deseja mais acesso ao mercado chinês. Em plena “guerra comercial” Starbucks anunciou planos para abrir 3.000 lojas na China e a Tesla, companhia de carros automáticos, abriu uma fábrica em Shangai para construir 150.000 carros por ano. A China é o mais lucrativo mercado, com um valor de 4 bilhões de dólares, para a National Basketball Association (NBA) e a Nike fez mais de 1,5 bilhão de dólares por ano na China.60-O mercado chinês se tornou tão importante para as companhias americanas que estas estão aceitando pressões para realizar adaptações culturais. Hollywood aceitou editar filmes, como o filme sobre Freddie Mercury, para poder ter acesso ao mercado chinês.61-Em 2019, dez Faculdades americanas fecharam Institutos Confúcio. Em Beijing, o governo determinou que as instituições públicas removessem todo equipamento de computador e programas de software estrangeiros.***62-Os Estados Unidos tem enormes vantagens militares sobre a China, mais de 20 vezes armas nucleares, força aérea muito superior, e orçamentos de defesa três vezes maiores que os da China, aliados como Japão e Coreia do Sul e potenciais aliados, como Índia e Vietnã, com capacidades militares próprias. A China não desfruta de situação sequer semelhante no Hemisfério Ocidental.***63-Em 2012, a China lançou seu primeiro porta-aviões e, em 2019, o segundo, e está construindo seis porta-aviões convencionais de natureza defensiva. A China também desenvolveu misseis, equipamento de defesa aérea e submarinos. Os Estados Unidos tem doze porta-aviões nucleares.64-Beijing considera importante controlar o Mar do Sul da China devido aos recursos naturais e a sua localização estratégica. Em 2012, a China ocupou um banco de areia perto das Filipinas chamado Scarborough Shoal ato ao qual os EUA não reagiram. Em 2014, a China começou a construir ilhas artificiais em cima de sete recifes no Mar do Sul, que considera como necessárias à sua defesa.65-A mais perigosa fronteira entre os Estados Unidos e a China se encontra em territórios contestados no Pacífico Ocidental: Taiwan, o Mar do Sul da China e uma série de recifes e bancos de areia. Desde 2016, ocorreram 18 encontros inseguros, de quase colisão no ar ou no mar, entre a China e os EUA.66-Taiwan se encontra a 130 km do continente chinês. Há 23 milhões de taiwaneses, sendo que 850 mil moram na China Continental e outros 404 mil lá trabalham. Em 2019, 2,71 milhão de chineses visitaram Taiwan.67-Em janeiro de 2019, Xi Jinping declarou que, eventualmente, Taiwan deverá e será reunida à República Popular da China e que a China se reserva o direito de usar de força contra qualquer intervenção de forças estrangeiras.68-A competição entre China e Estados Unidos também envolve pequenas ilhas e rochedos no Mar do Sul da China, sobre os quais diversos Estados reivindicam soberania. Os Estados Unidos tem se colocado do lado desses Estados contra a China, em uma questão importante para a navegação da Sétima Frota americana designada para operar na região oeste do Oceano Pacífico e no Oceano Índico, com base em Yokosuka no Japão.69-Em 2017, Xi Jinping afirmou que a China oferece um novo caminho para países subdesenvolvidos que desejam acelerar seu desenvolvimento e preservar sua independência.***70-Nas últimas décadas a balança de poder na Ásia Oriental se inclinou em favor da China. A China tem mísseis, aeronaves, navios de tal forma que pode afirmar que atingiu superioridade militar na região, enquanto Washington não consegue afirmar sua supremacia na região. As capacidades navais da China e o desenvolvimento de lasers, drones, cyberoperações, e espaço exterior estão alcançando as dos Estados Unidos.71-Os Estados Unidos e a China parecem estar se movendo em direção a uma separação que é menos econômica do que política e psicológica. Haverá uma decisão de “lutar, mas não esmagar” e tudo indica que a coexistência não será nem decoupling (desconexão) nem appeasement (apaziguamento), já que as economias destes dois países estão hoje, e estarão no futuro previsível, ligadas.***72-A luta pela hegemonia está, em grande parte, em suspenso pela pandemia. Vencida esta, a luta voltará e será um processo importante para o Brasil devido aos seus importantes vínculos com os Estados Unidos e com a China.Gostou do texto? 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Conhecimento Histórico e Internet / Carlo Ginzburg
Do livro de Maquiavel ao banco de dados de Manovich: a evolução das formas de hegemonia a partir dos suportes para a informação / Renata Lipia Lima
Arquivoresumo:A pesquisa objetiva investigar, por intermédio do conceito teórico de “Príncipe”, as formas de organização da sociedade e a evolução nas formas de hegemonia. Os meios de comunicação aparecem como fios condutores desse processo. A partir disso, então, jogaremos luz sobre a batalha entre o banco de dados e as narrativas nas mídias modernas, visando entender como a linguagem e as variadas formas de leitura podem interferir diretamente na confrontação das ideias, na direção moral, intelectual e na orientação para as disputas concretas existentes na sociedade.
A HISTÓRIA CULTURAL E A CONTRIBUIÇÃO DE ROGER CHARTIER / José D’Assunção Barros
ArquivoResumo. Este artigo busca esclarecer e discutir alguns aspectos relacionados àmodalidade da História Cultural, enfatizando mais especificamente a perspectivada História Cultural proposta por Roger Chartier. Discute, ainda, diversos dosconceitos envolvidos na perspectiva de História Cultural. O artigo remete a umaobra recentemente publicada pelo autor deste texto, cujo principal objetivo é ode elaborar uma visão panorâmica das diversas modalidades da História nos diasde hoje. Os historiadores de então passavam ao largo das manifestações culturais de todos os tipos que aparecem através da cultura popular, além de ignorarem igualmente que qualquer objeto material produzido pelo homem faz também parte da cultura – da cultura material. Além disto, negligenciava-se o fato de que toda a vida cotidiana está inquestionavelmente mergulhada no mundo da cultura. Ao existir, qualquer indivíduo já está automaticamente produzindo cultura, sem que para isto seja preciso ser um artista, um intelectual ou um artesão. A própria linguagem e as práticas discursivas que constituem a substância da vida social embasam esta noção mais ampla de Cultura. “Comunicar” é produzir Cultura, e de saída isto já implica na duplicidade reconhecida entre cultura oral e cultura escrita (sem falar que o ser humano também se comunica através dos gestos, do corpo e da sua maneira de estar no mundo social, isto é, do seu “modo de vida”).Apenas para exemplificar com uma situação significativa, tomemos um “livro”, este objeto cultural reconhecido por todos os que até hoje se debruçaram sobre os problemas culturais. Ao escrever um livro, o seu autor está incorporando o papel de um produtor cultural. Isto todos reconhecem. O que foi acrescentado pelas mais recentes teorias da comunicação é que, ao ler este livro, um leitor comum também está produzindo cultura. A leitura, enfim, é prática criadora – tão importante quanto o gesto da escritura do livro. Pode-se dizer, ainda, que cada leitor recria o texto original de uma nova maneira – isto de acordo com os seus âmbitos de “competência textual” e com as suas especificidades (inclusive a sua capacidade de comparar o texto com outros que leu e que podem não ter sido previstos ou sequer conhecidos pelo autor do texto original que está se prestando à leitura). Desta forma, uma prática cultural não é constituída apenas no momento da produção de um texto ou de qualquer outro objeto cultural, ela também se constitui no momento da recepção. Este exemplo, aqui o evocamos com o fito de destacar a complexidade que envolve qualquer prática cultural (e elas são de número indefinido). Entre o fim do século XI e o início do século XIII, o pobre - e entre os vários tipos de pobres o mendigo - desempenhava um papel vital e orgânico nas sociedades cristãs do Ocidente Europeu. A sua existência social era justificada como primordial para a “salvação do rico” (MOLLAT, 1989, p. 73). Conseqüentemente, o mendigo – pelo menos o mendigo conhecido – era bem acolhido na sociedade medieval. Toda comunidade, cidade ou mosteiro queria ter os seus mendigos, pois eles eram vistos como laços entre o céu e a terra – instrumentos através dos quais os ricos poderiam exercer a caridade para expiar os seus pecados. Esta visão do pobre como “instrumento de salvação para o rico”, antecipemos desde já, é uma “representação cultural”. No século XIII, com as ordens mendicantes inauguradas por São Francisco de Assis, a valorização do pedinte pobre recebe ainda um novo impulso. Antes ainda havia aquela visão amplamente difundida de que, embora o pobre fosse instrumento de salvação necessário para o rico, o mendigo em si mesmo estaria naquela condição como resultado de um pecado. O seu sofrimento pessoal, enfim, não era gratuito, mas resultado de uma determinação oriunda do plano espiritual. Os franciscanos apressam-se em desfazer esta “representação”. Seus esforços atuam no sentido de produzir um discurso de reabilitação da imagem do pobre, e mais especificamente do mendigo. O pobre deveria ser estimado pelo seu valor humano, e não apenas por desempenhar este importante papel na economia de salvação das almas. O mendigo não deveria ser mais visto em associação a um estado pecaminoso, embora útil. Daremos agora um salto no tempo para verificar como se transformaram estas práticas e representações com a passagem para a Idade Moderna. No século XVI, o mendigo forasteiro será recebido com extrema desconfiança. Ele passa a ser visto de maneira cada vez mais excludente. Suas “representações”, em geral, tendem a estar inseridas no âmbito da marginalidade. Pergunta-se que doenças estarão prestes a transmitir, se não será um bandido, por que razão não permaneceu no seu lugar de origem, por que não tem uma ocupação qualquer. Assim mesmo, quando um mendigo forasteiro aparecia em uma cidade, no século XVI ele ainda era tratado e alimentado antes de ser expulso. Já no século XVII, ele teria a sua cabeça raspada (um sinal representativo de exclusão), algumas décadas depois ele passaria a ser açoitado, e já no fim deste século a mendicidade implicaria na condenação. O mendigo, que na Idade Média beneficiara-se de uma representação que o redefinia “instrumento necessário para a salvação do rico”, era agora penalizado por se mostrar aos poderes dominantes como uma ameaça contra o sistema de trabalho assalariado do Capitalismo, que não podia desprezar braços humanos de custo barato para pôr em movimento suas máquinas e teares, nem permitir que se difundissem exemplos e modelos inspiradores de vadiagem. O mendigo passava a ser representado então como um desocupado, um estorvo que ameaçava a sociedade (e não mais como um ser merecedor de caridade). Ele passa a ser então assimilado aos marginais, aos criminosos – sua representação mais comum é a do vagabundo. Algumas canções e obras literárias irão representá-lo com alguma freqüência desta nova maneira, os discursos jurídicos e policiais farão isto sempre. As novas tecnologias de poder passariam a visar a sua reeducação, e quando isto não fosse possível, a sua punição exemplar. Novas práticas irão substituir as antigas, consolidando novos costumes. as representações podem incluir os modos de pensar e de sentir, inclusive coletivos, mas não se restringem a eles. Quando um pintor produz a sua representação de uma catedral, com tela e tintas, ou quando um escritor descreve ou inventa uma catedral através de um poema ou de um romance, temos em ambos os casos representações, embora não coletivas. Tal como assevera Jacques Le Goff (1994, p. 11), o campo das representações “engloba todas e quaisquer traduções mentais de uma realidade exterior percebida”, e está ligado ao processo de abstração. O âmbito das representações, ainda conforme Le Goff, também pode abarcar elementos associados ao Imaginário – noção que poderá ser melhor compreendida quando falarmos na História do Imaginário. As representações do poder – como, por exemplo, a associação do poder absoluto ao Rei-Sol, a visualização deste poder em termos de centro a ser ocupado ou de cume a ser atingido – associam-se a um determinado imaginário político. “Símbolo” é uma categoria teórica já há muito tempo amadurecida no seio das ciências humanas – seja na História ou na Antropologia, seja na Sociologia ou na Psicologia. Não é mais uma “noção”, mas sim um “conceito” que pode ser empregado “quando o objeto considerado é remetido para um sistema de valores subjacente, histórico ou ideal” (LE GOFF, 1994, p. 12). Alguns símbolos podem ser polivalentes. A serpente, por exemplo, pode ser empregada como símbolo do ciclo, da renovação (sentido inspirado pela mudança de pele que ocorre ciclicamente no animal serpente), mas também pode ser empregada como símbolo da astúcia, da maldade (sentidos que remetem ao universo bíblico). Aquilo que os historiadores da cultura têm chamado de campo das representações pode abarcar tanto as representações produzidas no nível individual (as artísticas, por exemplo), como as representações coletivas, os modos de pensar e de sentir As representações podem ainda ser apropriadas ou impregnadas de uma direção socialmente motivada, situação que remete a outro conceito fundamental para a História Cultural, que é o de “ideologia”. A Ideologia, de fato, é produzida a partir da interação de subconjuntos coerentes de representações e de comportamentos que passam a reger as atitudes e as tomadas de posição dos homens nos seus inter- relacionamentos sociais e políticos. No exemplo do mendigo, vimos como as suas representações sociais e deslocamentos no universo mental dos homens medievais atendiam a determinados interesses sociais ou a determinadas motivações coletivas. Podemos dizer que aquelas representações estavam sendo apropriadas ideologicamente. A difusão de uma franca hostilidade com relação ao mendigo do período moderno e a impregnação de novas tecnologias de exclusão nos discursos que o tomam como objeto (a sua classificação como vagabundo, a raspagem da cabeça) acabam fazendo com que, sem o querer, a maioria das pessoas da sociedade industrial comece a pressionar todos os seus membros a encontrar uma ocupação no sistema capitalista de trabalho. Isto é um processo ideológico. Cabe precisamente aos historiadores da cultura examinar estas relações ideológicas, para que não realizem uma História da Cultura meramente descritiva, como aquela que propunha Huizinga em um famoso ensaio do início do século XX, ao afirmar que o objetivo fundamental da História Cultural é meramente morfológico, “ou seja, a descrição de padrões de cultura ou, por outras palavras ainda, pensamentos, sentimentos e a sua expressão em obras de arte e de literatura” (BURKE, 1992, p. 15). É também este mesmo tipo de História da Cultura o que foi realizado por Jacob Burckhardt no século XIX, ao procurar recuperar aquilo que chamou de “espírito da época” na sociedade renascentista (BURCKHARDT, 1992). Esclarecidos os conceitos fundamentais que acabam permeando qualquer reflexão encaminhada pela História Cultural – ideologia, símbolo, representação, prática ⎯ podemos voltar ao horizonte teórico inaugurado por Chartier dentro do enfoque histórico-cultural, o qual tem na noção de “representação” um dos seus fundamentos. De fato, a história cultural, tal como a entende o historiador francês, “tem por principal objeto identificar o modo como em diferentes lugares e momentos uma determinada realidade cultural é construída, pensada, dada a ler” (CHARTIER, 1990, p. 17).As representações - acrescenta Chartier - inserem-se “em um campo de concorrências e de competições cujos desafios se enunciam em termos de poder e de dominação”; em outras palavras, são produzidas aqui verdadeiras “lutas de representações” (CHARTIER, 1990, p. 17). E estas lutas geram inúmeras “apropriações” possíveis das representações, de acordo com os interesses sociais, com as imposições e resistências políticas, com as motivações e necessidades que se confrontam no mundo humano. Estamos aqui bem longe do modelo de História da Cultura proposto por Huizinga. O modelo cultural de Chartier é claramente atravessado pela noção de “poder” (o que, de certa forma, faz dele também um modelo de História Política).
Jorge de Albuquerque Vieira - Visita à exposição A Arte e a Ciência - Nós entre os extremos
Vídeo O conhecimento (a arte também) é importante para a sobrevivência. A arte cuida das realidades possíveis.Concebível/possível - o que a nossa cabeça pode imaginar. Cada um vê o mundo de certa maneira, dentro dos limites de espaço, tempo, matéria.Cada espécie viva, ao que tudo indica, é encontrou uma maneira de ver o mundo.Abelhas conseguem perceber a luz ultravioleta. Já o tubarão parece que vê campos eletromagnéticos. Como se cada espécie vivesse numa bolha. A parte interna está ligada a realidade, ao objetivo. A parte interna se aproxima da subjetividade. Entre elas tem uma interface que codifica e recodifica o que está fora e chegue ao que está dentro. Bio-semiótica. O mundo ao redor. Cada bicho vê a realidade de acordo com esse mundo.Nós vemos o mundo a partir de uma janela bem restrita do espectro eletromagnético, como um reflexo da adaptação às nossas necessidades de sobrevivência.A realidade é aquilo que não depende de você, mas pode se forçar sobre você. O real pode estar fora da sua percepção, mas ele age sobre você. Se você quer sobreviver você vai ter que perceber o que te ameaça mesmo que esteja fora dessa bolha onde se vive. Representação de um mundo que não se vêExistem distâncias enormes que a gente percebe. E distâncias minúsculas que a gente não consegue perceber. Os níveis cósmicos. Cosmo, megacosmose microcosmo (física quântica).O ser humano tenta olhar além da bolha. Nós inventamos o mundo, fazemos ficções. Se você é um cientista você procura qual a melhor ficção, mais coerente com a possível realidade. Modelos são representação do real. Os cientistas fazem isso o tempo todo. Isso é um ato de criação. O artista cria, naturalmente. O cientista, quando é necessário. Sempre.Matéria - algo que existe durante determinado tempo. Sentimos o tempo e percebemos o espaço.A obra representa um calendário de 1 milhão de anos, entre o passado e o futuro.Primeiro você se encanta, se apaixona pela realidade, porque ela é bela. Estética. Depois você desenvolve uma atitude compatível com o seu amor. Ética. Só depois que você pode conhecer. Casamento entre arte e ciência.Objetivista ou subjetivista. Qual veio primeiro?
O conhecimento é necessário o tempo todo do ponto de vista evolutivo para que uma espécie permaneça no tempo. E se a arte é considerada como um tipo de conhecimento, ela tem exatamente essa função, no mesmo sentido que a ciência tem: conhecer a realidade e propor uma forma coerente entre o sistema vivo e o sistema da realidade. O que isso significa?A realidade para a ciência seria a expressão do real. Já pro artista a arte cuida das realidades possíveis [...] existe a concepção daquilo que é possível e daquilo que é concebível. O possível seria regido pelas leis da realidade, que não dependem de nós. São objetivas. É o que pode ocorrer, o que pode acontecer, o que pode ser. Já o concebível seria aquilo que a nossa cabeça consegue imaginar, mesmo que a gente não tenha esperança de encontrar pra isso um dia dentro da realidade. Tem, mas isso traz uma questão interessante: cada um vê o mundo de uma maneira. E esse processo não é aleatório. Ao que tudo indica, essa função do ambiente de onde ela emerge. Essas espécies vivas são sistemas abertos, trocam informações com o ambiente o tempo todo. [...] e captam do real as pistas pra poder fazer uma adequada interpretação a esse real externo.
Organização e Sistemas / Jorge de Albuquerque Vieira
ArtigoResumoPretendemos neste artigo apresentar e discutir o conceito de Organização segundo uma perspectiva sistêmica. Acreditamos que tal enfoque facilita e esclarece o estudo da autoorganização e suas aplicações em várias áreas, já que a mesma tem sido desenvolvida em teorias no âmbito de uma Teoria Geral dos Sitemas, segundo uma abrangência ontológica.
Projeto de trabalho: O Modernismo e a hegemonia cultural paulista
ArquivoO Modernismo e a hegemonia cultural paulista"Todo grupo social, ao nascer do terreno originário de uma função essencial no mundo da produção econômica, cria também, organicamente, uma ou mais camadas de intelectuais que conferem homogeneidade e consciência da própria função não apenas no campo econômico, como também no social e político: o empresário capitalista gera junto consigo o técnico da indústria, o cientista da economia política, o organizador de uma nova cultura, de um novo direito etc..." (GRAMSCI, 2003:53)O parágrafo acima, contido numa das primeiras leituras propostas no curso foi o que gerou meu interesse em tratar de um tema sobre o qual muito se falará, que é a Semana de Arte Moderna de 1922, por conta da celebração do seu centenário.No início do século XX, o Brasil agrário, que se livrava da monarquia e da escravidão, preparava-se para entrar na era industrial. Enriquecida pela produção e exportação do café, nascia uma burguesia nacional que, aliada à chegada da mão de obra de imigrantes europeus e japoneses, dava os primeiros passos para a criação de um país que se imaginava urbano e moderno. Faltava, no entanto, o suporte cultural para as expressões artísticas, e a Semana de Arte Moderna foi a pedra fundamental que iria romper com o conservadorismo vigente, condenando as correntes literárias e artísticas da época, mais especificamente o Parnasianismo e o Simbolismo.O trabalho pretende analisar como os fatos concomitantes da modernização econômica e a chegada da corrente artística denominada Modernismo no início do século XX no Brasil são vistos sob a lente das teorias estudadas, particularmente no que se refere ao estudo da construção da hegemonia cultural, que no Brasil foi conduzida por esse movimento, de forte origem paulista.A base histórica de consulta será um livro que ainda está no prelo, gentilmente cedido na íntegra pelo editor e que deve ser lançado em outubro próximo, chamado Semana de 22, de autoria de José De Nicola. Na parte teórica as ideias de Antonio Gramsci a respeito de hegemonia cultural serão acrescidas dos materiais disponibilizados ao longo do curso. Sobre Gramsci, temos os seguintes materiais reservados à pesquisa:• The Gramsci Moment / THOMAS, Peter D.• Hegemony & Power / FONTANA, Benedetto• Odeio os indiferentes: escritos de 1917 / Antonio Gramsci; seleção, tradução e aparato crítico Daniela Mussi, Alvaro Bianchi. - 1. Ed. - São Paulo: Boitempo, 2020.• De Rousseau a Gramsci: ensaios de teoria política / Carlos Nelson Coutinho - São Paulo: Boitempo, 2011
Teoria Geral dos Sistemas / Günter Wilhelm Uhlmann
ArquivoEste Trabalho foi realizado para contribuir com o entendimento e a difusão do pensamento sistêmico, determinante no estabelecimento das estratégias de permanência na contemporânea, assim chamada, sociedade do conhecimento, ou da tão propalada Era da Informação. A percepção do autor, auferida da sua vivência acadêmica, superior a 20 anos em disciplinas voltadas à gestão de sistemas sociotécnicos e de cadeiras voltadas à especifica gestão de sistemas de informação; lhe trouxe a percepção da ausência de literatura, na medida do possível atualizada e didática acerca desta ainda Proto Teoria Geral dos Sistemas.A partir e com esta percepção, valendo-se de metodologia científica de rigor abrandado, encetou-se o presente trabalho ainda, tal qual a própria teoria dos sistemas, inacabado. Cônscio das suas limitações e imperfeições, aguarda e agradece as contribuições.
Teoria Geral dos Sistemas e os Sistemas de Informação / Carlos Alessandro Barbosa
ArquivoA Teoria Geral dos Sistemas busca apresentar uma forma diferente de se ver o conceito e a aplicação de sistemas como um todo. Não tendo sido desenvolvida especi camente para uma única área do saber, esta teoria abrange diversos âmbitos, sendo, portanto, utilizada inclusive no segmento das tecnologias.Desta forma, este artigo pretende abordar essa teoria sob a perspectiva dos Sistemas de Informação.
Tempo e caos: a “imaginação dos possíveis” e os média / Gustavo Castro e Florence Dravet
ArquivoResumo Este artigo propõe uma reflexão sobre a noção de tempo e suas relações com os média, a partir dos estudos da complexidade e numa perspetiva transdisciplinar. Iniciando com reflexões sobre narrativas literárias e cinematográficas, o nosso objetivo é perceber como a noção de tem@@@po é mediadora da compreensão da realidade espaço/tempo e da perceção estética do mundo entre ordem e caos. Recorremos ao diálogo entre ciência e narrativa e ao pensamento da física moderna sobre os conceitos de tempo, ordem e caos. As nossas conclusões apontam para três ideias: 1) a constante rememoração da catástrofe é um tema íntimo obsessivo que se apresenta através da narrativa artística e mediática; 2) a expressão da obsessão catastrófica vem suprir parcialmente o afeto pelo horror da humanidade atual e 3) o imaginário da catástrofe atravessa tempo e espaço e é transdisciplinar.
A revolução Cibernética: a nova cultura / Viviane Hengler Corrêa Chaves
ArquivoResumoEste artigo parte do seguinte problema de pesquisa - como as contribuições da Cibernética aliadas ao conhecimento de outras ciências, se completam num mundo sistêmico assistido por computadores? O objetivo geral é fazer uma reconstituição histórica do surgimento e evolução da Teoria Cibernética, por meio da história de seu idealizador, Norbert Wiener. Tem como objetivo específico entender a lógica matemática subjacente a sua teoria, seus aspectos técnicos e sua abrangência, bem como a problemática, social e científica, que a Cibernética impõe ao mundo contemporâneo. Ressalta-se que, nesta contextualização, torna@@@se possível compreender a mobilização da ciência durante a Segunda Guerra Mundial e as transformações, políticas e científicas, resultantes desse conflito. Além disso, outra vertente deste artigo, consiste em observar sua influência no surgimento de outras ciências e aplicações, cujos desdobramentos no período pós-guerra contribuíram para mudar a humanidade. O efeito das tecnologias de comunicação e controle sobre a cultura e o desenvolvimento social sempre foram examinados, pormenores, por Wiener. Assim, questões de cunho filosófico e ético, embasadas nas suas próprias conquistas científicas, e abordadas por ele, ao longo de sua vida, também, constituem tema relevante deste trabalho. Trata-se de pesquisa bibliográfica e documental fomentada nas obras e documentos de Norbert Wiener.
Por que as comunicações e as artes estão convergindo? / Lucia Santaella
Memes na internet: a "zoeira" e os novos processos constituidores de sentido entre estudantes / Douglas Calixto
ArquivoO gênero meme (e seus respectivos subgêneros, como paródias de vídeos e GIFs) possuem funções e relações dinâmicas com a ação comunicativa dos usuários da internet e, concluímos, é factível explorar e analisar as representações e os códigos simbólicos que os estudantes estão elaborando quando mediados por essas tecnologias. Nesse sentido, é possível dizer que os memes — para destacar alguns dos resultados de nosso estudo — acionam uma dimensão singularizadora das formas de ser e estar mundo. Ora, os espaços educativos são permeados pelas mensagens, os jogos de linguagem e, por mais estarrecedor que pareça num primeiro momento, pela zoeira. Logo, mesmo que proibidos na escola, a cultura que crianças e adolescentes estão desenvolvendo é marcada pelos fluxos comunicacionais, descentralizados, com linguagens híbridas e intertextuais. Os memes na internet sintetizam esse turbilhão de movimentos que integram as relações sociais organizadas em “rede”. Compreendê-los é, em última instância, um passo importante para construir pontes e interlocuções com os discentes. Resumo Este trabalho discute os memes na internet como uma linguagem articuladora dos sentidos entre jovens estudantes. Compartilhados em larga escala nas redes sociais, montagens, piadas e paródias ‘memeais’ passaram a ocupar lugar de destaque no cotidiano, tornando-se um vetor cultural nas dinâmicas formativas e na constituição das sociabilidades. Nesse sentido, a partir da investigação de mestrado apresentada na ECA-USP, apresentaremos o entendimento dos memes enquanto gênero discursivo e como essa linguagem tem consequências nas discussões sobre as tecnologias na educação e no contexto juvenil. É destacado também como a ‘zoeira na internet’ integra um quadro histórico de transformações sociotécnicas que aciona novas formas de ser e estar no mundo, tendo desdobramento em como alunos e alunas convivem no ambiente escolar.
Informação e redundância. Os Quadros da Incerteza / António Fidalgo
ArquivoQuestão: o texto considera o cartesianismo como sequência aritmética de conhecimento (o hd uma hora fica cheio), ao passo que a evolução sistêmica, a partir do conceito binário do sei/não sei, a incerteza, reembaralha as cartas e o jogo do conhecimento recomeça?
Informação e redundância -> certezaQuantidade e medição da informação é inversamente proporcional à sua probabilidade -> Quanto mais provável for um signo, menor a sua informação. Informação é incerteza e redundância é certeza. "Cometer-se-ia o erro de reduzir o cartesianismo a uma con- cepção patrimonial de conhecimento, o que sabemos é aquilo de que já estamos certos, e de o contrapor a uma concepção processual de informação, do que ainda não sabemos. São, contudo, coisas distintas e não podem ser contrapostas sem mais. Aliás, nada im- pede de considerar que o processo cartesiano de adquirir certezas é um processo informa- tivo, pois que a incerteza é condição de no- vos conhecimentos. Conhecer não seria re- pisar o já sabido, mas em tornar o incerto e o desconhecido em certo e conhecido.Uma e outra posição estariam erradas, ou seja, tanto a contraposição como a com- paginação dos dois modelos descuram ou ignoram a especificidade radical da noção de informação na teoria matemática da comu- nicação, especificidade essa que impede de estabelecer quaisquer associações apressa- das entre os dois modelos." O mínimo da informação, a unidade, é a escolha entre duas mensagens.
Ora é justamente essa partilha, esse ponto comum, que constitui a redundância necessária subjacente à comunicação. Ou seja, apesar da redundância não representar qualquer informação, ela é fundamental para a exactidão da mensagem e mesmo para a sua ocorrência.
O destino de tudo é a desordem. Entropia O grande desordenadamento do cosmos criou sua complexidade.Não seria o contrário? Mas nesse movimento da ordem para a desordem é possível criarmos algo novo
VídeoVivemos nesse mundo abstrato feito de coisas reais, o nundo vitrual da significação.Os computadores são capazes de manipular de maneira automática os signos da linguagem, a significação que está na mente humana
Pierre Lévy - A comunicação mutante
VídeoEstamos vivendo uma grande mutação da comunicação por causa do desenvolvimento da informática, dos computadores que podem comunicar-se entre si, numa rede que se tornou o novo meio de comunicação entre as pessoas.A internet contém hoje a memória da humanidade, onde tudo está disponível e acessível.